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Retomada do crescimento e déficits nas contas correntes

Estado de São Paulo


Fruto de um bom diagnóstico e da competente execução da política econômica, no último ano melhorou muito o desempenho da economia brasileira. Há razões de sobra para festejar o controle da inflação – obtido sem qualquer artificialismo – ao lado da retomada da atividade econômica.

Mas será que os resultados espetaculares da balança comercial e das contas correntes estão em pé de igualdade? Nos últimos 12 meses o superávit comercial chegou a US$ 65 bilhões, e recentemente as contas correntes têm mostrado superávits mensais anualizados. Infelizmente tal comportamento não é um atestado da saúde da economia e nem da qualidade da política econômica, e sim a consequência da depressão dos investimentos.

O Brasil sofre de uma crônica insuficiência de poupanças domésticas, precisando absorver poupanças externas para financiar os investimentos, e sempre que ocorre uma elevação na taxa de investimentos ocorre um aumento do déficit nas contas correntes. A força desta restrição orçamentária é tal que leva a uma relação linear muito estável entre as importações e a formação bruta de capital fixo, tudo se passando como se existisse uma relação tecnológica que obrigasse o aumento das importações pari passu ao aumento dos investimentos.

A recessão provocou um tombo nos investimentos, acarretando redução semelhante nas importações. Mas o Brasil está voltando a crescer, e quanto maiores forem as taxas de investimento maiores serão as importações e os déficits nas contas correntes, que têm que ser sustentáveis, impondo uma restrição ao crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) potencial.

Os saudosistas da “substituição de importações” ao lado de influentes grupos de pressão proporiam que deveríamos recorrer a dois instrumentos: a elevação dos índices de conteúdo nacional; e o aumento de tarifas sobre importações de máquinas e matérias primas.

Recentemente tivemos exemplos nesta direção, como a nova tentativa de promover a indústria naval e a construção de sondas para a Petrobrás. Os beneficiados por estas medidas são os produtores de máquinas, equipamentos e matérias primas, porém à custa da elevação dos seus preços, o que penaliza todos os demais setores, cujas taxas de retorno sobre os investimentos encolhem. Com isso cai o investimento global e a produtividade da economia, que são as únicas fontes do crescimento.

O caminho correto para superar tal restrição é a elevação das poupanças domésticas. Felizmente, as medidas fiscais necessárias para conter o crescimento da relação dívida/PIB, sem o que não haverá a retomada do crescimento, são as que levam ao aumento da poupança do governo – que atualmente é negativa – e responde pela redução da poupança total doméstica.

Mas o governo optou por um ajuste fiscal muito lento, e se no meio tempo o País se defrontar com taxas de investimento mais elevadas terá que conviver com déficits elevados nas contas correntes. A nossa história nos dá a dimensão do que poderá ocorrer: entre 2010 e 2013, quando as taxas de investimento se mantiveram entre 21% e 22% do PIB, os déficits nas contas correntes oscilaram entre US$ 80 e US$ 100 bilhões.

Dependendo do grau de estabilidade econômica, do nível de segurança jurídica e de respeito à rule of law, déficits como estes – ou ainda maiores – poderiam ser financiados com fluxos de investimentos diretos e em carteira, como ocorre na Austrália, que devido à solidez de suas instituições é um país desenvolvido, com uma renda per capita superior à do Reino Unido e da União Europeia.

Da mesma forma como o Brasil, no entanto, ela é altamente dependente das poupanças externas, e nos últimos 30 anos sustentou déficits nas contas correntes em média em torno de 4% do PIB, e por alguns poucos anos em torno de 6%. Não temos a qualidade das instituições da Austrália, e por isso não deveríamos sonhar com déficits maiores.

Se não superarmos a restrição imposta pela escassez das poupanças domésticas teremos enormes dificuldades em manter taxas de investimento elevadas. Este, ao lado do crescimento da produtividade do trabalho, é o único caminho aberto à aceleração do crescimento econômico.

As opiniões aqui expressas são do autor e não refletem necessariamente as do CDPP, tampouco as dos demais associados.

 

 

 

  

Sobre o autor

Affonso Pastore