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Juro subirá lá fora, e políticos não sabem o tamanho da encrenca

Folha de São Paulo


Tivemos na semana passada a última reunião do Federal Reserve sob o comando de Janet Yellen, quando se decidiu pela manutenção dos juros básicos americanos entre 1,25% e 1,50% anual, sinalizando, porém, que a taxa subirá durante o ano, ainda que deva se manter abaixo do nível que, espera-se, prevalecerá no longo prazo.

Apesar da mensagem tranquilizadora, o mercado de títulos começa a mostrar preocupação: a taxa de juros para dez anos, talvez a mais importante do sistema solar, subiu de algo como 2,5% ao ano para pouco mais de 2,8% anuais do começo de janeiro para cá, o nível mais elevado desde o observado no fim de 2014.

Não se trata, à primeira vista, de um grande movimento e, para falar a verdade, é ainda um nível historicamente baixo (para os mais curiosos, a série desde 1953 pode ser vista aqui, mas já foi suficiente para afetar não só o dólar no Brasil mas as Bolsas em todo o mundo, que sofreram forte queda.

O fato é que os dados mostram a economia americana crescendo na casa de 2% a 2,5% ao ano desde 2010, suficiente para reduzir de modo persistente a taxa de desemprego, que caiu de 10% ao final de 2009 para 4,1% nos últimos quatro meses, nível que parece representar o pleno emprego naquele país.

Apesar de outras medidas (mais amplas) de desemprego sugerirem a possibilidade de alguma folga escondida no mercado de trabalho americano, tal folga, se existir, também não é das maiores. Não por acaso, o salário médio por hora subiu quase 3% em janeiro deste ano, o ritmo mais forte desde junho de 2009. De forma consistente, as projeções no mercado de títulos para a inflação subiram para pouco mais de 2% ao ano no horizonte de dez anos.

É bom deixar claro que não estamos falando de gigantesca aceleração inflacionária; no entanto, na comparação com os últimos anos, período em que salários não pressionaram a inflação, trata-se de uma dinâmica visivelmente distinta.

O receio, portanto, do mercado de renda fixa, que se exprime na forma de juros mais elevados, parece refletir a percepção de que a reação da política monetária terá que ser um tanto mais rápida, e mais vigorosa, do que as três elevações de 0,25% que se imaginavam como o cenário mais provável para 2018.

Esse risco se agrava na presença do estímulo proveniente do corte de impostos aprovado no fim do ano passado, que deve elevar a demanda no curto prazo ainda mais rapidamente.

Até agora vivemos um momento muito particular da economia global: conjugamos crescimento forte e disseminado com liquidez abundante, que estimula a busca por taxas de retorno (e risco) mais elevadas.

O primeiro ajuda o desempenho das nossas exportações, portanto nosso equilíbrio externo; já a segunda tem anestesiado investidores no que se relaciona à paralisia reformista mesmo em face de um sério desequilíbrio fiscal no país.

É bom ter em mente que essa janela não permanecerá aberta indefinidamente. Se, de fato, estamos observando os primeiros movimentos da transição para um mundo mais normal, com taxas de juros mais elevadas nos países ricos, reformas se tornam ainda mais urgentes.

Pelo andar da carruagem, contudo, o mundo político ainda não se deu conta do tamanho da encrenca. Quando perceber, poderá ser tarde demais.

As opiniões aqui expressas são do autor e não refletem necessariamente as do CDPP, tampouco as dos demais associados.

Sobre o autor

Alexandre Schwartsman