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Livro relaciona corrupção a deficiências de infraestrutura

Folha de S. Paulo, Mercado, Cifras&Letras – Crítica


Na obra “Infraestrutura, eficiência e ética”, organizada pelo economista Affonso Celso Pastore, ex-presidente do Banco Central, 14 autores tentam responder a uma pergunta que se repete há décadas, mas segue crucial: por que o Brasil não investe em infraestrutura?

Em nove capítulos, esse grupo multidisciplinar reunido pelo Centro de Debate de Políticas Públicas (CDPP) aborda em profundidade problemas já conhecidos, como risco regulatório, falta de segurança jurídica, dificuldades de financiamento etc.

A obra, no entanto, inova ao trazer uma causa negligenciada para a falta de estradas, portos e ferrovias no país: corrupção. Não é por acaso, portanto, que o prefácio coube ao juiz Sergio Moro, responsável pela maior investigação de corrupção do Brasil, a Operação Lava Jato.

Moro cita um discurso do ex-presidente americano Theodore Roosevelt proferido em 1903 em que ele diz que “não existe crime mais sério que a corrupção”, porque “o agente corrupto saqueia a cidade inteira ou o Estado”.

Para o juiz, a Lava Jato revelou uma corrupção sistêmica no país que impacta as possibilidades de desenvolvimento da infraestrutura e do bem-estar em geral.

“Além dos óbvios custos de propina, inseridas em contratos públicos, afugentam-se investidores e há custos indiretos decorrentes da provável tomada de decisões econômicas ineficientes”, escreve.

Depois das revelações dos prejuízos provocados pelo cartel de empreiteiras que atuava na Petrobras, as conclusões de Moro parecem evidentes, mas nem sempre foi assim. Basta recordar que até o início dos anos 1980 a maioria dos especialistas era favorável à presença estatal não apenas na infraestrutura mas também em setores estratégicos, como petróleo ou mineração.

Essa percepção só mudou quando ficou clara a ineficiência das estatais e quando a crise fiscal demonstrou que a participação do setor privado é essencial. Paradoxalmente, no entanto, as dificuldades não cessaram com o início de privatizações, concessões e parcerias público-privadas.

Há vários motivos para o fracasso do Brasil na infraestrutura, que vão desde a incapacidade técnica do governo para desenhar os projetos até a tentativa de limitar os lucros dos investidores.

Nesse aspecto, os economistas Vinicius Carrasco e João Manuel Pinho de Mello fazem um bom trabalho ao demonstrar os prejuízos provocados pela intervenção promovida pela ex-presidente Dilma Rousseff (2011-2016) no setor elétrico.

SETOR PRIVADO

O setor privado, no entanto, também tem sua parcela de culpa. Ao longo do texto, diversos autores explicam como o capitalismo de laços subverte os conceitos econômicos que deveriam nortear uma licitação ou uma concessão.

As empresas fazem ofertas inexequíveis nos leilões apenas para vencer a licitação já contando com futuros aditivos. Deixam de investir em redução de custos para apostar no lobby e na corrupção de agentes públicos.

Nas licitações da Petrobras, esse esquema se tornou regra. A refinaria Abreu e Lima, por exemplo, foi orçada em US$ 2,5 bilhões, mas seu custo atingiu US$ 18 bilhões.

Para os autores, o Brasil terá de fazer um grande esforço para inibir os cartéis e aumentar a competição, elevando multas e acabando com exigências de conteúdo local.

SOLUÇÕES

Aliás, um dos méritos do livro é não apenas diagnosticar os problemas mas trazer sugestões. O advogado Modesto Carvalhosa propõe, por exemplo, a adoção do modelo americano de “performance bonds” para acabar com o capitalismo de laços.

Nos “performance bonds”, uma seguradora é contratada pelo governo para cobrir 100% do risco do empreendimento, fiscalizando a construtora e indenizando o poder público, se for o caso.

Num dos capítulos mais interessantes, a economista Maria Cristina Pinotti vai além dos efeitos microeconômicos da corrupção e percorre a literatura internacional em busca de evidências do seu impacto no crescimento e no investimento.

Ela, aliás, ressalta que, no Brasil, apesar da extensão dos problemas, são poucos os economistas que se dedicam a destrinchar o assunto. Fica, portanto, o desafio para que os autores desse livro e outros especialistas se debrucem sobre outros impactos da corrupção no Brasil.


Por Raquel Landim

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