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Com fim de auxílio de R$ 600, Bolsa Família precisa dobrar, diz Naercio

Proposta de ampliação elevaria custo do programa para R$ 70 bilhões

Naercio Menezes Filho: Problema da pobreza e do desenvolvimento infantil não é resolvido transferindo R$ 150 por família — Foto: Claudio Belli/Valor
Naercio Menezes Filho: Problema da pobreza e do desenvolvimento infantil não é resolvido transferindo R$ 150 por família — Foto: Claudio Belli/Valor

O governo precisará dobrar o volume de recursos do programa Bolsa Família para realizar uma transição com o fim do auxílio emergencial de R$ 600, disse ontem economista Naercio Menezes Filho, professor da cátedra Ruth Cardoso do Insper e da Universidade de São Paulo (USP) durante “live” do Valor. Para ele, isso vai exigir elevar a carga tributária.

Naercio afirmou que o problema do Bolsa Família é o baixo valor do benefício pago, na faixa de R$ 150 por família. Ele propôs focar o programa nas crianças de zero a 12 anos e elevar o valor do benefício para algo entre R$ 400 e R$ 800 por criança. Dessa forma, o “Bolsa Família turbinado” permitiria encerrar o auxílio sem forte repique da pobreza.

“Você não consegue resolver o problema da pobreza e do desenvolvimento infantil transferindo R$ 150 por família”, ponderou Naercio, acrescentando que, além da renda mensal, a cobertura do Bolsa Família também deveria ser ampliada, abarcando um percentual maior da população pobre do país.

De acordo com o economista, a proposta de ampliação do Bolsa Família elevaria o custo anual do programa de R$ 35 bilhões para R$ 70 bilhões.

“Obviamente nós temos que ser cautelosos com a questão da dívida pública e da sustentabilidade fiscal, não podemos entrar numa onda de ignorar a questão fiscal”, disse ele. “Porém, o dinheiro que mais tem retorno a longo prazo é o dinheiro investido na primeira infância.”

O economista acredita que o valor de R$ 70 bilhões caberia no Orçamento da União se houver aumento de impostos. Ele defendeu que a população pague a mesma alíquota de Imposto de Renda (IR) no momento de transferir rendimentos da empresa para a pessoa física: empresas simples, dividendos, juros sobre capital próprio.

O economista acredita que o valor de R$ 70 bilhões caberia no Orçamento da União se houver aumento de impostos. Ele defendeu que a população pague a mesma alíquota de Imposto de Renda (IR) no momento de transferir rendimentos da empresa para a pessoa física: empresas simples, dividendos, juros sobre capital próprio.

“A hora que você fizer um sistema mais justo, em que todos pagam a mesma alíquota do trabalhador formal, você consegue recuperar esses R$ 70 bilhões, ou até mais”, disse o economista, propondo ainda medidas como elevação da alíquota máxima do IRPF para 35%, o imposto sobre herança, eliminação de deduções de dependentes, educação e saúde do IRPF.

O professor elogiou o programa de renda emergencial, tanto na criação, pelo Congresso, quanto pela implementação, pelo governo federal. “É muito difícil atender 60 milhões de pessoas em dois meses”, destacou ele, para quem, não fosse pelo plano emergencial, a pobreza extrema estaria em níveis mais elevados. “Haveria uma tragédia social, basicamente”.

Reportagem do Valor publicada na terça-feira mostrou que a proporção da população vivendo na miséria – com menos de US$ 1,90 de renda domiciliar per capita por dia, o correspondente a R$ 154 por mês per capita – foi de 3,3% em junho, atingindo o menor nível em mais de 40 anos. O motivo foi o pagamento do benefício para informais e desempregados no período.

Para Naercio, no entanto, a atuação do governo federal na área da saúde foi “um desastre”.

“Você só vai ter uma redução do desemprego à medida que a sociedade conseguir controlar a pandemia e as empresas reabrirem e expandirem seus empregos”, disse ele.

Na “live”, o economista lembrou que o Brasil é um país de profundas desigualdades de oportunidades. E, segundo ele, a pandemia agravou essa situação.

“Quem nasce em família mais privilegiada tem mais facilidade para realizar seus sonhos na vida, ao passo que quem nasce nas famílias pobres tem mais dificuldades. É normal uma sociedade ter desigualdade de resultados, lá na frente, mas é essencial que o ponto de partida seja igual para todos”, disse Naercio.

Ele acrescentou que, no Brasil, as oportunidades são desiguais devido a diversos fatores, como a baixa qualidade do ensino público e os investimentos menores na primeira infância. “Em primeiro lugar, os mais pobres, quando ficam doentes, têm uma probabilidade maior de morrer porque vão para hospitais de pior qualidade e já têm doenças preexistentes”, disse.

Fonte: Valor Econômico, por Rafael Rosas e Bruno Villas Bôas

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