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As pessoas se aposentam mais cedo nos Estados mais ricos

Folha de São Paulo


Continuamos à espera da nova proposta de reforma da Previdência, que —segundo decisão acertada de Rodrigo Maia— deverá passar por todo o rito associado a emendas constitucionais, com direito a debates na Comissão de Constituição e Justiça, bem como em comissão especial, assim como no caso do projeto ora em discussão.

Isso significa que as chances de aprovação da reforma ainda no primeiro semestre do ano são baixas, o que não é necessariamente um problema, desde que as perspectivas de que o tema avance no Congresso sejam boas.

De qualquer forma, estamos muito próximos do momento em que o novo governo deverá explicitar seu plano. Já houve vazamentos de minutas, assim como desmentidos, ou seja, nada muito diferente do que se espera em torno daquela que será, sem dúvida, a medida mais importante do ponto de vista de política econômica neste momento.

A definição aguarda a recuperação do presidente, após a cirurgia no começo do ano. Não se sabe ainda o que ele pensa a respeito, mas não falta quem se proponha ao papel de porta-voz.

De acordo com “assessores”, citados pelo Pravda, perdão, Valor Econômico, “Bolsonaro tem defendido que a reforma precisa considerar as diferenças regionais do país e costuma citar, por exemplo, que é difícil estabelecer 65 anos no Piauí, onde a expectativa de vida é 69 [anos]”.

Independentemente de isso refletir (ou não) a visão presidencial, é necessário retornar a um ponto sobre o qual já escrevi no passado, mas que segue como um dos temas de mais difícil entendimento quando se discute a questão previdenciária: a diferença da expectativa de vida ao nascer e a expectativa de vida condicionada à idade.

No Brasil, a expectativa de vida ao nascer é 76 anos, mas esse número é muito afetado pela mortalidade infantil e pela violência, que aflige principalmente homens jovens.

Quando, porém, se chega aos 46 anos, a expectativa de vida sobe para 80 anos, atingindo quase 84 anos quando pessoas se aposentam por idade (aos 65 anos), um tanto abaixo da Dinamarca e um pouco melhor do que a República Tcheca, em linha com Argentina, México e Polônia, como se pode aprender com o excelente estudo de Gabriel Nemer e Carlos Góes para o Instituto Mercado Popular.

O mesmo estudo nota que não há grandes diferenças entre os estados no momento da aposentadoria: em todos a expectativa de vida aos 65 anos supera os 80 anos (por pequena margem em Rondônia e vai até 85 anos no Espírito Santo).

Já outro trabalho, de Rogério Costanzi e Gabriela Ansiliero para o Ipea, citado pelo infatigável Pedro Nery, aponta para diferenças gritantes na idade média de aposentadoria por estado, de pouco mais de 57 anos em Santa Catarina para quase 65 anos em Roraima (e 63,6 anos no Piauí).

Dito de outra forma, as pessoas se aposentam mais cedo precisamente nos estados mais ricos, ou seja, a criação de uma idade mínima para aposentadoria por tempo de contribuição afetaria pouco os estados pobres (e muito os estados ricos).

A ideia, portanto, de diferenças regionais quanto à idade de aposentadoria, à parte as dificuldades de implementação e enormes oportunidades para a fraude, não se sustenta à luz das estatísticas populacionais.

Só resta torcer para que o presidente passe no Posto Ipiranga antes de tomar qualquer decisão.

As opiniões aqui expressas são do autor e não refletem necessariamente as do CDPP, tampouco as dos demais associados.

Sobre o autor

Alexandre Schwartsman