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EUA e China, nossos maiores parceiros globais, se movimentam, e nós só olhamos

Folha de São Paulo


Agora, mais do que nunca, estamos pagando o preço por se manter à margem do processo de globalização

O presidente Donald Trump mostra documento com imposição de tarifas e restrição de investimentos chineses – Evan Vucci/Associated Press

O mundo está ficando mais complexo do que sempre foi, agora sob o risco de conflitos comerciais em grande escala. É uma razão a mais para apressarmos o passo das mudanças no Brasil antes que o atraso econômico e tecnológico que fomos acumulando nos últimos 15 anos se torne uma barreira intransponível a qualquer reação.

Nas últimas três décadas, o protecionismo e o mercantilismo assumidos em certos episódios pelos EUA e de forma mais aberta e frequente pela China ao longo de sua meteórica ascensão não impediram a proliferação de acordos de livre-comércio que deram ritmo e moldaram a globalização. Mas a chegada de Donald Trump à Casa Branca provocou fissuras na coexistência até agora relativamente harmônica nessa espécie de G2 do poder mundial.

Trata-se de um risco latente para o Brasil. O país se manteve à margem da globalização e não colheu os frutos desse movimento, nada fazendo para assumir um papel relevante no comércio internacional, equivalente ao porte de sua economia. Não é de hoje que carecemos de uma política externa que promova nossa inserção no cenário de intenso intercâmbio comercial, produtivo, tecnológico e cultural que floresceu no mundo nos últimos tempos.

O isolamento, agora, cobra seu preço e injeta alta dose de urgência na necessidade de abrir a economia. Os instrumentos para levar tal processo adiante têm sido utilizados com sucesso por outros países e se encontram à nossa disposição. Basta querer usá-los.

A integração aos grandes acordos comerciais, por exemplo, representa uma etapa essencial nessa trajetória. Nesse sentido, o recente progresso nas negociações entre Mercosul e União Europeia serve como alento, assim como os primeiros acenos do governo brasileiro em direção ao CPTPP, o Tratado Transpacífico, assinado dias atrás por 11 países das Américas, da Ásia e da Oceania.

Não bastam, porém, boas intenções para romper o isolamento e a letargia que o país impôs a si mesmo. Gestos mais efetivos serão necessários para demonstrar claramente a disposição de dar mais fluidez às relações com parceiros internacionais.

A redução das alíquotas de importação para níveis mais próximos dos padrões internacionais em prazo definido seria um sinal inequívoco de mudança na orientação da atual política do toma lá dá cá. Além disso, essa medida é, por si só, um bem para a economia, devido aos benefícios provenientes do maior acesso a insumos, bens de capitais e tecnologias mais baratos e mais avançados.

Esses seriam passos iniciais para o Brasil se reposicionar na economia mundial, cujo modelo de funcionamento é cada vez mais ditado pelas duas potências globais. Ignorá-las não é solução, sob o risco de ficar sem abrigo no fogo cruzado de decisões sobre as quais não tem nenhum controle. Qualquer movimento brusco entre os dois titãs é para preocupar.

Com a China, deveríamos buscar maior refinamento nas relações, hoje assentadas nas vendas de commodities e compras de manufaturas. No investimento, os aportes chineses têm visado áreas de menor dinamismo tecnológico. Tais assimetrias não nos convêm.

Com histórico de decisões unilaterais, China e EUA exigem atenção. Imprevistos de qualquer ordem poderão agravar-se no Brasil, que se ressente do atraso no campo das tecnologias disruptivas e da frágil projeção global decorrente da miopia da política externa. É questão a ser tratada pelos candidatos na corrida presidencial.

Por via da dúvida, é prudente passarmos a checar o humor de Trump e Xi Jinping, ao menos enquanto persistir a ideia de que somos apenas coadjuvantes no palco da geopolítica global e anões no comércio mundial.

As opiniões aqui expressas são do autor e não refletem necessariamente as do CDPP, tampouco as dos demais associados.

 

Sobre o autor

Pedro Passos