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A macroeconomia da pandemia

São comuns cenários com queda da economia de 5% ou mais; o desemprego subirá muito

Esta crise é única. Em razão do risco para a saúde de todos nós, estamos desligando a economia. No mundo todo. Têm sido comuns cenários com queda da economia de 5% ou até mais. O desemprego subirá muito.

Difícil saber o impacto da crise sobre a demanda e a oferta. Para simplificar, suponha uma economia com dois setores, A e B, cada um responsável por metade da produção e do emprego e, portanto, da geração de renda.

Para simplificar ainda mais, suponha que toda a renda seja do trabalho. Não há capital nessa economia hipotética.

 Desempregados enfrentam fila em busca de uma oportunidade de trabalho em São Paulo
Desempregados enfrentam fila em busca de uma oportunidade de trabalho em São Paulo – Danilo Verpa – 17.set.2019/Folhapress

O setor A representa atividades essenciais e que, portanto, serão mantidas ao longo do período de adoção do distanciamento social (DS). O setor B será interrompido.

As pessoas que trabalham no setor B ficarão em casa, e as que trabalham no setor A trabalharão normalmente, mas no resto do tempo ficarão em casa com seus parentes. O DS impede que se consuma o bem produzido no setor B.

Finalmente, suponha que a adoção do DS será por um trimestre. Em seguida, vida normal.

consumo de todos será reduzido à metade. Para que não haja desequilíbrios na economia, há políticas públicas com vistas a manter a renda de todos. Para tal, será necessária a manutenção dos salários do setor B.

Durante um trimestre, tempo de vigência do DS, haverá queda do produto de 50% ou queda de 12,5% em um ano.

Para mitigar os efeitos depressivos da política de supressão da atividade produtiva, o Tesouro sustenta a renda do setor B. A manutenção de todas as rendas do setor B implicará a elevação da dívida pública no fim de 2020 em 12,5 pontos percentuais (pp) do PIB, ou 14 pp do PIB de 2020, que será 12,5% menor.

Se tudo der certo, teremos o seguinte: os trabalhadores do setor B ficam em casa; os trabalhadores do setor A trabalham normalmente; todos consomem os produtos essenciais do setor A; a parte da renda referente ao consumo do setor B será poupada. No fim de 2020, a dívida pública terá crescido em 12,5 pp do PIB, e os detentores da dívida serão os trabalhadores do setor A e B, que, ao longo do período de supressão da atividade, tiveram seu consumo reduzido em 50% por um trimestre.

No exemplo hipotético que construí, a crise não gerou nem excesso de demanda nem de oferta. A sustentação da renda manteve a demanda normal das atividades essenciais, e a perda de produto foi integralmente socializada na forma de elevação da dívida pública.

Nessas circunstâncias, o Banco Central não deve nem subir nem reduzir a taxa de juros. A política fiscal, ao sustentar a renda, fez todo o serviço. Para o futuro, a carga tributária terá que ser maior, ou o gasto público, menor, para pagar pelo maior endividamento.

Note que não há necessidade de compensação total da perda de renda. Se as rendas dos trabalhadores do setor B forem compensadas em metade da queda da produção, já será suficiente para a manutenção da demanda pelos bens essenciais produzidos pelo setor A. A dívida pública, em vez de aumentar em 12,5 pp do PIB, se elevaria em 6,25 pp.

No mundo real, e para o setor privado, a compensação será certamente menos do que integral. Salários serão reduzidos, e é possível que empresas quebrem. Nesse cenário, não faz sentido que o setor público garanta a integralidade dos salários dos servidores que não trabalham nos setores essenciais.

Chama a atenção o gesto do governador do Rio Grande do Sul, que abriu mão de 30% de seu salário no período de calamidade pública. Essa medida deveria ser estendida a todos os altos salários do funcionalismo público.

Fonte: Folha de SP

As opiniões aqui expressas são do autor e não refletem necessariamente as do CDPP, tampouco as dos demais associados.

Sobre o autor

Samuel Pessôa