Presidente volta-se para programa de maior intervencionismo na economia
Há fortes sinais de uma reviravolta “desenvolvimentista” na política econômica. Percebe-se que o presidente está altamente tentado a quebrar o teto de gasto para que haja espaço para a elevação do investimento em infraestrutura e expansão da política social (em relação ao status quo pré-pandemia).
Ao menos é o que se depreende dos acontecimentos da semana e das mensagens, explícitas ou cifradas, que o próprio presidente envia à sociedade.
Na sexta-feira (14), esta Folha divulgou a elevação da popularidade do presidente. A soma de ótimo e bom subiu cinco pontos percentuais (pp), de 32% para 37%, e a avaliação negativa, dada pela soma de ruim e péssimo, caiu 10 pp, de 44% para 34%. Na região Nordeste, a queda da avaliação negativa foi de 17 pp, de 52% para 35%, e a positiva subiu 6 pp, de 27% para 33,3%.
Assim, além da elevação da popularidade do presidente, aparentemente há uma troca da natureza do apoio. Bolsonaro consegue penetrar em regiões que nas últimas eleições têm votado no PT, fato bem notado na entrevista do cientista político André Singer a esta Folha no domingo passado (9).
Bolsonaro pode estar repetindo dois movimentos já observados em nosso passado. Do ponto de vista da política econômica, após um início em que ensaiou apoio a uma agenda de reformas e de ajuste fiscal, talvez mais como farsa, e não realmente como ocorreu no governo Castello Branco, volta-se para uma programa de maior intervencionismo na economia e de desequilíbrio fiscal. Rapidamente, Bolsonaro pode refazer, com nuances, a trajetória da formulação da política econômica da ditadura militar.
Na política, Bolsonaro parece caminhar para repetir o ciclo que tem ocorrido com todas as forças que mantêm alguma hegemonia ou autoridade política durável no Brasil há muitas décadas.
A nova força política surge com forte apoio do eleitorado da região Sudeste. Com o passar dos tempos e o natural processo de desgaste, o apoio no Sudeste cai ou desacelera, e a base eleitoral do grupo político que tem a liderança do Executivo nacional se movimenta para o Nordeste, a região mais dependente das transferências do governo central.
Bolsonaro talvez faça a jato, em alguns anos, o trânsito que fizeram, em década ou década e meia, aproximadamente, a Arena nos anos 1960/1970; o MDB nos anos 1970/1980; e o PSDB nos 1990 (vale lembrar que Serra em 2002 venceu em Alagoas); e o PT nos anos 2000/2010.
Na sexta, em excelente coluna intitulada “Predestinados”, Angela Alonso notou um traço comum entre a família de Caetano Veloso e a de Jair Bolsonaro: diversos filhos com a mesma atividade profissional do pai. Em ambos os casos, o pai é extremamente bem-sucedido em seu campo de atuação. Os filhos conseguem se beneficiar do capital social do pai para se lançar na mesma atividade profissional.
Angela nota que, “tão distintas em tanto, as duas famílias se assemelham neste ponto: os pais subiram e transmitem aos filhos oportunidades e recursos para permanecer no topo”. Nada de novo aqui. É a história de nossa desigualdade abissal.
Há outro ponto, no entanto, que vale notar. Se os filhos tiveram o caminho aberto para seguir os passos do pai, essa escolha ficou mais fácil pela nossa estagnação secular. Desde meados dos anos 1980, a produtividade do trabalho praticamente não cresce.
O início da vida profissional para todo adulto jovem ficou muito difícil. Para aqueles que têm a oportunidade de um caminho desse tipo, diante da mediocridade de nossa economia, a opção ficou ainda mais natural.
Fonte: Folha de SP
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