Ilan Goldfajn e Sergio Margulis
Globo (publicado em 13/07/2021)
O financiamento sustentável está em alta no mercado financeiro. Respondendo à demanda de investidores, os administradores de ativos estão criando diversos instrumentos e fundos ambientais, sociais e de governança (ESG na sigla em inglês) para canalizar com mais eficiência essa demanda.
Pesquisa da Morningstar mostra que o número de investidores ESG aumentou de 81 para 138 em 30 empresas de energia limpa nos 12 meses que terminaram em fim de 2020. Os investidores comuns também aumentaram de 390 para 624 no mesmo período.
Nas economias avançadas, produtos não sustentáveis começam a ser rejeitados principalmente pelos mais jovens. Com isso, empresas se veem forçadas a aderir a práticas mais sustentáveis. Ironia: a mudança está ocorrendo via mecanismos de mercado.
Já faz 50 anos do artigo do economista Milton Friedman no The New York Times onde estabeleceu o princípio que, sob determinadas condições, a maximização do retorno aos acionistas leva a um resultado que também é o socialmente desejável.
O princípio de Friedman é um ponto de partida, mas na ausência das condições originais, exige-se uma análise mais profunda. O impacto ambiental do crescimento econômico não internalizado pelas empresas é uma destas condições faltantes. Questiona-se a ideia que o acionista poderia cuidar por conta própria dos seus objetivos ambientais e deixar as empresas cuidarem dos retornos financeiros.
A crise da Covid-19 reacendeu a preocupação nas economias avançadas sobre o aquecimento global e sustentabilidade ambiental. Os programas de recuperação pós-pandemia buscam incentivar modelos de crescimento ambientalmente sustentáveis, com baixas emissões de gases de efeito estufa, aumentando a resiliência aos impactos das mudanças do clima, assegurando empregos e melhoria da distribuição de renda.
Bancos Centrais, investidores e instituições financeiras têm um papel relevante nesse processo. Organizações Internacionais como o Institutional Investors Group on Climate Change (IIGCC), que inclui mais de 300 investidores em 22 países, com mais de € 37 trilhões em ativos — estão mobilizando capital para a transição de baixo carbono e para garantir resiliência aos impactos das mudanças do clima.
O mercado nacional de títulos verdes da China tem se expandido rapidamente, com emissão US$ 16 bilhões nos três primeiros meses de 2021. A tendência é clara.
No Brasil, a emissão de títulos verdes atingiu US$ 5,1 bilhões desde 2014 — uma fração de seu potencial. Em 2020, o governo federal editou o Decreto 10.387, que possibilita a ampliação de mercado de títulos verdes de modo a atrair recursos para projetos que tenham impactos socioambientais positivos, em especial os de baixo carbono nos setores de energia, mobilidade e saneamento básico.
O Banco Central, por sua vez, lançou no final do ano passado a agenda de sustentabilidade para o Sistema Financeiro Nacional — um conjunto de diretrizes e ações de modernização do sistema financeiro, introduzindo e incentivando medidas relacionadas a riscos climáticos, responsabilidade socioambiental e cultura de sustentabilidade.
Recentemente, colocou em consulta pública uma determinação que vai exigir que as instituições financeiras passem a considerar mudanças climáticas na sua política de gerenciamento de riscos.
O caminho está traçado, mas a travessia não é óbvia. O mercado financeiro seguirá acompanhando os objetivos dos investidores — e as diretrizes dos reguladores — na sua conscientização da necessidade de financiar um crescimento sustentável.
Haverá dificuldades e recuos, mudanças desta magnitude no paradigma do crescimento não são lineares, mas a direção parece clara quando se observa o comportamento do investidor.
Link da publicação: https://oglobo.globo.com/economia/convergencia-pelo-brasililan-goldfajn-sergio-margulis-sustentabilidade-do-financiamento-responsavel-25105427
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