Globo (publicado em 06/08/2021)
Empresários que assinaram o manifesto de apoio ao processo eleitoral brasileiro em resposta aos ataques de Jair Bolsonaro à urna eletrônica e ao presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Luís Roberto Barroso, dizem que tomaram a decisão de romper o silêncio sobre a ofensiva do presidente ao identificar um risco real de ameaça à democracia e às instituições.
Sentiram a necessidade de mandar um recado claro, reforçando que a sociedade não aceitará retrocessos autoritários.
Ex-presidente do Santander e do Grupo Abril, o administrador Fábio Barbosa afirmou que o manifesto foi importante para externalizar a visão de um grupo grande e diverso de líderes empresariais, economistas, cientistas políticos e outros intelectuais de que não há duvidas sobre a lisura e credibilidade do processo eleitoral no país.
Ele contou que a mobilização começou informalmente e logo ganhou uma grande adesão.
— O manifesto começou com uma conversa de grupos pelo WhatsApp e logo teve adesão maciça. Mostrou o anseio em se manifestar sobre a questão, e faltava uma posição mais enfática dos empresários — disse, acrescentando que o manifesto chegou a 7 mil assinaturas.
Barbosa frisou que, em vez desse tipo de crise, há outras prioridades a serem enfrentadas, como a reforma tributária, administrativa. E ressaltou que o processo eleitoral não deve ser o foco neste momento:
— Há muitas outras prioridades no país. Por isso decidimos nos posicionar.
Outro líder empresarial influente a assinar a carta, o CEO do Credit Suisse no Brasil, José Olympio Pereira, disse que o país vive “um quadro dramático de crise institucional em formação” e que a sociedade “não pode assistir calada”.
— Minha sensação é de que estamos igual ao sapo na panela. A temperatura está aumentando e a sociedade e os mercados estão fingindo que nada existe. Isso é muito grave. Temos que pular (da panela) enquanto é tempo. Não podemos assistir calados. É preciso dar um basta e esvaziar esse balão antes que a crise se forme — disse José Olympio em entrevista à coluna Capital, do GLOBO.
Para Olympio, o mercado financeiro em particular está “surpreendentemente leniente” em relação à crise institucional provocada por Bolsonaro.
— A situação é mais séria do que o que está refletido nos mercados e isso tem a ver com um cenário externo muito favorável — avaliou. — Estou preocupado com o ano que vem. Podemos ter uma bagunça. Não acredito que vamos ter golpe ou que as Forças Armadas vão tentar algo fora da caixa. Mas podemos ter muita confusão e radicalização e isso é muito ruim.
Segundo Luiz Fernando Figueiredo, sócio-fundador da gestora paulista Mauá Capital e ex-diretor de Política Monetária do Banco Central, o manifesto não menciona diretamente o presidente porque “a ideia não é fulanizar o debate”.
— As instituições no Brasil são parrudas. Independentemente disso, é importante que a sociedade deixe claro que a gente não aceita discussões que possam colocar em xeque o que a gente já tenha institucionalizado no país. É para deixar claro que estamos olhando e não estamos brincando. A sociedade não aceita isso — disse Figueiredo, em entrevista à coluna Capital, do GLOBO.
Outro signatário do manifesto, Guilherme Leal, um dos fundadores da Natura e copresidente do conselho de administração da empresa, explicou que considera “totalmente inaceitável” que lideranças políticas questionem a realização de eleições:
— A sociedade precisa se manifestar em alto e bom som. Não se discute eleição. Cumpre-se o que está na legislação. A sociedade precisa se manifestar de forma enfática para defender o Estado democrático de Direito.
Leal conta que teve contato com o manifesto por meio do Centro de Debate de Políticas Públicas (CDPP), organização que reúne empresários, economistas e cientistas políticos.
A troca de mensagens ganhou força após as declarações do presidente, com a “situação aguda de confrontação entre Poderes”, descreveu o empresário:
— Infelizmente, é um momento inédito. Fui para a rua no movimento das Diretas Já e vivi os tempos escuros da ditadura, sei o valor que tem a democracia. Ela não vem de graça e precisa ser resguardada. Mas ela vem explicitamente sendo colocada em dúvida. Toda hora se fala de “dentro e fora de linhas”. Isso é uma ameaça que a sociedade não pode aceitar e precisa se manifestar com clareza.
Link da publicação: https://oglobo.globo.com/economia/empresarios-decidiram-romper-silencio-ao-ver-risco-institucional-real-nas-ameacas-de-bolsonaro-as-eleicoes-1-25143316
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