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Nordeste em divergência?

Diário do Nordeste

Desde o início da pandemia, os economistas do Itaú vêm utilizando dados agregados de gastos em cartões de crédito e débito para monitorar a atividade econômica praticamente em tempo real – com defasagem de quatro ou cinco dias. O indicador resultante, IDAT, retratou com precisão os distintos momentos da economia do país desde o início da pandemia.

Partindo de uma base 100, o IDAT retratou um mergulho inicial na atividade econômica, acompanhando o colapso da mobilidade social, na segunda quinzena de março de 2020 – o indicador atingiu seu mínimo mensal em abril, 40% abaixo do patamar pré-pandemia.

A isso, seguiu-se uma gradual recuperação, tanto da atividade, capturada pelo IDAT, quanto de indicadores de mobilidade. Ambos voltariam a recuar no início de 2021, sob os efeitos da variante Gama de COVID-19, a chamada variante Manaus, caindo de 92 em outubro a 86 em março-abril de 2021. Esse período marcou, também, o pico do número de óbitos desde o início da pandemia.

O quadro sanitário, econômico e de mobilidade voltaria a melhorar a partir de meados do ano, com o avanço da campanha de vacinação. A partir de setembro, contudo, a recuperação do IDAT perdeu ímpeto, ao passo que a mobilidade continuou melhorando, evidenciando os efeitos da aceleração da inflação sobre o poder de compra e a confiança dos consumidores, bem como algum impacto inicial do aperto da política monetária.

Desde meados de fevereiro, o IDAT ganhou impulso renovado, e a economia do país parece estar ganhando dinamismo mais forte. As explicações, ainda tentativas, são várias: redução da taxa de poupança das famílias, certa recuperação do poder de compra motivada pelo aumento do salário-mínimo, ganhos do funcionalismo estadual e municipal, e dissídios, e, mais recentemente, melhora dos preços das exportações. Com isso, o indicador parece estar rodando 10-15% acima do patamar pré-pandêmico, apontando para uma taxa de crescimento positiva no ano.

economia nordestina, tanto quanto conseguimos captar pelo IDAT, tem exibido dinâmica distinta da nacional nos últimos seis meses. As tendências setoriais também são diferentes. Cabe a ressalva que, para fins de comparações regionais, consideramos apenas gastos em cartão de crédito presenciais, o que pode dar uma perspectiva limitada do conjunto das atividades econômicas.

No que se refere ao consumo de bens, a atividade no Nordeste parece vir em queda desde fevereiro. No entanto, a região teve um final de ano mais forte do que as regiões Norte e Centro-Oeste. Já quanto aos serviços, o Nordeste também mostra recuperação, mas também em velocidade aparentemente menor do que nas regiões Norte e Centro-Oeste. O consumo de serviços nas regiões Nordeste e Norte tinha trajetória muito parecida até o final do ano passado, mas tem se distanciado desde então.

Diferenças no desempenho do mercado de trabalho devem ser parte da explicação para a aparente divergência. De fato: indicadores de mercado de trabalho do quarto trimestre do ano passado mostram que a renda real do trabalho no Nordeste teve uma queda drástica no segundo semestre de 2021, o que pode ter afetado o consumo nesse começo de ano.

Historicamente, as taxas de desemprego no Nordeste têm sido mais elevadas do que no resto do país, no entanto, a diferença em relação às outras regiões se acentuou durante a pandemia e continuou a aumentar até o último trimestre de 2021. Diferenças regionais nas tendências da mobilidade social parecem irrelevantes, então não devem ajudar a explicar uma divergência.

Estima-se que o Nordeste tenha uma parcela maior da população recebendo o Auxílio Brasil do que as demais regiões – pouco mais de 40%, ante uma média nacional de 24%, utilizando dados do Ministério da Cidadania e IBGE. Os dados ainda não capturam esse efeito, mas é razoável esperar que nos próximos meses esse programa contribua para reduzir a percepção de distância que tem sido observada desde a virada do ano entre a economia nordestina e o resto do país.

Link da publicação: https://diariodonordeste.verdesmares.com.br/opiniao/colunistas/mario-mesquita/nordeste-em-divergencia-1.3210336

As opiniões aqui expressas são do autor e não refletem necessariamente as do CDPP, tampouco as dos demais associados.

Sobre o autor

Mario Magalhães Carvalho Mesquita