Folha
Na última coluna de 2021, apostei que o crescimento em 2022 seria de 1% a 1,5%.
Dois seriam os motores do crescimento: primeiro, a normalização dos setores de serviços, principalmente outros serviços, ainda muito afetados pela epidemia; e, segundo, o impulso fiscal positivo, fruto do ciclo político na despesa pública em ano eleitoral.
Adicionalmente, a forte criação de empregos em razão da normalização dos serviços gera impulso adicional sobre a demanda. De fato, no primeiro trimestre, em comparação ao primeiro trimestre de 2021, a massa salarial real cresceu 3%.
A política monetária que joga contra o crescimento deve bater na atividade econômica somente no quarto trimestre de 2022. De qualquer forma, com o que tivemos de crescimento até maio, há indícios de um cenário para a atividade em 2022 um pouco melhor do que imaginei no fim de 2021. A economia deve crescer algo como 2% em 2022.
Por outro lado, temos recebido seguidas notícias ruins no front inflacionário. Após um conjunto incrível de choques inflacionários desde o segundo semestre de 2019, há, mais recentemente, inúmeros sinais de que a inflação adquire vida própria. A inflação se torna inercial.
Com isso, o ano terminará com a taxa de desemprego entre 9% e 9,5%, com inflação, sem manipulações, em torno de 9,5%, e, provavelmente, inflação de serviços na casa de 8% a 9%. O novo governo receberá uma economia próxima da taxa natural de desemprego, isto é, próxima do pleno emprego, com inflação muito elevada e inercial.
Não haverá muita opção. O novo governo terá de reduzir o gasto público em 2023. O crescimento do PIB em 2023 provavelmente será negativo. Teremos ambas, a política fiscal e a monetária, com o sinal correto diante da conjuntura, que é o sinal contracionista. Se a política fiscal não for contracionista em 2023, colheremos somente mais inflação e mais endividamento público, o que significa ainda mais inflação à frente.
E a crise social? O que fazer? Crise social se combate com Estado de bem-estar financiado por meio de receita de impostos. Não há saída melhor. Teremos que aumentar a carga tributária já em 2023 ou reduzir o gasto em outros itens do Orçamento, para haver orçamento público de forma a aumentar a assistência social.
Qualquer outra solução é apostar no populismo latino-americano que gerou o desastre econômico da Venezuela e a inflação que caminha para 80% ao ano na Argentina.
Em setembro deste ano, fará uma década que ocupo este espaço. No início, minha agenda era o contrato social da redemocratização. A decisão, absolutamente legítima, de nossa sociedade de priorizar a queda da desigualdade e deixar como variável residual o crescimento econômico.
Desde o final de 2013, quando ficou claro, para mim, que tínhamos um problema fiscal estrutural grave, a agenda da coluna foi tentar contribuir para que a sociedade encontre um equilíbrio não inflacionário. Estamos ainda em meio a esse problema.
Tudo indica que o equilíbrio político demandará nova rodada de elevação da carga tributária. E tudo indica que, corretamente, serão procuradas formas de fazê-lo que sejam socialmente mais justas.
Sobre como fazê-lo, os interessados devem consultar o livro recentemente publicado em formato eletrônico, “Progressividade tributária e crescimento econômico”, organizado por meu colega do FGV Ibre, Manoel Pires, com o apoio da Samambaia Filantropias.
Link da publicação: https://www1.folha.uol.com.br/colunas/samuelpessoa/2022/07/contracao-fiscal-em-2023.shtml
As opiniões aqui expressas são do autor e não refletem necessariamente as do CDPP, tampouco as dos demais associados.