Folha
Na semana que passou tivemos a divulgação da inflação de julho para a economia americana. A inflação foi de 0% ante junho e, em 12 meses, diminuiu de 9,1% em junho para 8,5% em julho. Começa o processo de redução da inflação cheia nos Estados Unidos. A queda foi liderada pelo preço das matérias-primas de energia, com deflação em julho de 7,6%.
Há muita reversão de choques de preços para ocorrer nos próximos meses. Por exemplo, a inflação de alimentos fechou julho a 11% em 12 meses.
A taxa básica de juros fixada pelo Banco Central deles, o Fed, após a elevação de 0,75 ponto percentual na reunião de final de julho, encontra-se no intervalo entre 2,25% e 2,5%. Tudo sugere que o ciclo de alta da taxa básica, conhecida por Fed Funds, irá até o intervalo de 3,75% a 4%. Em algum momento no primeiro trimestre de 2023 o Fed encerrará o ciclo de alta.
A dúvida maior é o grau de inércia na inflação no final do primeiro trimestre de 2023. Uma outra maneira de olhar o problema é sabermos em que nível a inflação se estabilizará após a reversão dos choques. Provavelmente em uma faixa entre 3% e 5%. Exatamente em que valor ninguém sabe. Há sinais de que o processo inflacionário está muito disseminado. Nos últimos 12 meses, a mediana das taxas de variação dos diversos itens que compõem o IPCA deles elevou-se 6,7%.
Se em março de 2023 descobrirmos que a inflação está próxima de 3% e as expectativas 12 meses à frente apontam inflação na casa de 2,5%, o Fed –dado que a meta é 2% e que nos últimos anos aumentou a tolerância do BC dos EUA com desvios da meta para maior– pode começar um ciclo de normalização da taxa de juros. O custo em termos de desemprego da desinflação terá sido muito baixo. Será uma excelente notícia.
Se, por outro lado, em março de 2023 a inflação se estabilizar em 5% e as expectativas 12 meses à frente estiverem na casa de 3,5% ou mais, o Fed não poderá parar o ciclo de elevação da taxa básica de juros. Será necessária uma desaceleração mais acentuada da economia americana para que a taxa de desemprego suba e, consequentemente, se quebre a inércia e a inflação caia.
No primeiro semestre a economia americana recuou 2,5%: 1,6% no primeiro trimestre e 0,9% no segundo. No primeiro trimestre, o recuo ocorreu em função de dificuldades de a oferta atender à demanda privada, visto que esta cresceu 2,5%. No segundo trimestre houve queda no investimento imobiliário e no consumo de bens. No entanto, o consumo de serviços cresceu acima de 4%. Adicionalmente, parcela significativa da demanda no segundo trimestre foi atendida por queda dos estoques, que retiraram 2 pontos percentuais do crescimento.
Dessa forma, não parece que a “recessão técnica” no primeiro semestre tenha sido de fato uma recessão fruto de carência de demanda agregada. Muito pelo contrário. Parece ter havido dificuldade de a oferta atender à demanda, consequência ainda da desorganização das cadeias produtivas globais e da guerra.
Também houve quedas, no segundo trimestre, no investimento imobiliário e no consumo de bens duráveis, em função da alta fortíssima desses segmentos na recuperação após a parada brusca da economia no segundo trimestre de 2020. Mesmo considerando a queda no segundo trimestre, o investimento imobiliário ainda roda 10% acima do nível observado no final de 2019 e o consumo de duráveis, 22% acima, para uma economia que está 2% acima.
E os dados de mercado de trabalho não apontam nenhuma acomodação. Em julho houve criação de mais de 500 mil empregos e os salários têm subido. Segundo o acompanhamento dos salários conduzido pela unidade do Fed de Atlanta, que limpa os resultados de movimentos provocados apenas por alterações na composição da força de trabalho, em julho os salários nominais elevaram-se 6% em 12 meses e 7% nos últimos três meses. Para aqueles trabalhadores que mudaram de emprego, os números são de respectivamente 6,7% e 8,5%.
Não parece que a desinflação será indolor.
Link da publicação: https://www1.folha.uol.com.br/colunas/samuelpessoa/2022/08/combate-a-inflacao-nos-eua.shtml
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