Folha
Há todo um debate recente em teoria monetária. Na visão tradicional, a taxa de juros é o regulador da demanda agregada. Se a inflação está acima da meta e o mesmo ocorrer com a expectativa de inflação, o Banco Central sobe os juros. Tudo ocorre inversamente se a inflação e a expectativa de inflação estiverem abaixo da meta.
Há leituras alternativas. A mais popular em diversos círculos tem sido a teoria monetária moderna (TMM). Como já tratei neste espaço, não há grandes novidades na TMM. O que é novo não é bom, e o que está correto não é novo.
De qualquer forma, mesmo os adeptos da TMM reconhecem que os limites para uma política monetária e fiscal frouxa são dados pela restrição de recursos da economia. Ou seja, as complexas questões monetárias em última instância são subalternas à velha e conhecida escassez.
A divergência, portanto, é com o ponto a partir do qual uma economia opera a pleno emprego. Os adeptos da TMM consideram que economias operam a pleno emprego quando a taxa de desemprego está bem abaixo de 5%. Provavelmente por volta de 3% ou um pouco mais. Esses pontos foram tratados na coluna de 17 de dezembro.
No último trimestre de 2022, a taxa de desemprego brasileira deve ter rodado em torno de 8%. Como argumentei na coluna de 17 de dezembro, desde 1996 o desemprego rodou abaixo desse valor somente em um período em que havia claros sinais de desequilíbrio, entre o 4º trimestre de 2011 e o 1º trimestre de 2015.
Nesse período, a inflação de serviços esteve sempre acima da inflação cheia e os salários sempre subiram além da produtividade do trabalho. Outro sinal de desequilíbrio foi a piora das contas externas e das contas públicas que ocorreu no período.
Vários leitores consideram que não faz sentido o pleno emprego ocorrer com desemprego a 8%. No entanto, há diversos países em que a taxa de desemprego que mantém a inflação de preços e de salários estável ocorre para valores próximos de 8%. Essa taxa de desemprego que mantém a inflação de preços e de salários estável também é conhecida por desemprego estrutural.
Segundo dados da Comissão Europeia, a taxa de desemprego estrutural varia de 3%, na República Tcheca, até pouco mais de 13%, na Espanha. Para a Itália, a taxa é de 9,5%, e, para a França e Portugal, 8,5%. Considerei a média do desemprego estrutural para o período 2015 até 2022. Ou seja, os países latinos da Europa apresentam valores para a taxa de desemprego estrutural superiores a 8%.
Uma aproximação do desemprego estrutural é dada pela média da taxa de desemprego em um horizonte largo de tempo. Entre 1996 e 2013, o desemprego médio no Brasil foi, segundo dados da Pnad Contínua, de 9,7%. Com a reforma trabalhista do governo Temer, é possível que a taxa de desemprego estrutural tenha caído para algo mais próximo de 8%. Ainda não temos dados suficientes para medir.
De qualquer forma, e a partir da experiência dos países latinos da Europa, não há nada de estranho em uma taxa de desemprego que não acelere a inflação na casa de 8%.
Link da publicação: https://www1.folha.uol.com.br/colunas/samuelpessoa/2023/01/pleno-emprego.shtml
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