Precisamos reduzir as fontes de incerteza na economia brasileira para recuperar a confiança dos agentes do mercado
InfoMoney
Existe uma parcela dos agentes do mercado que está mais otimista com o crescimento econômico brasileiro em 2023, estimando algo como alta de 1,5%. Esse otimismo, na sua maior parte, tem sido justificado por uma forte expectativa comum: a surpresa positiva que virá do setor agropecuário.
Embora a contribuição deste setor para o PIB total seja menos relevante quando comparada com o setor de serviços ou indústria, espera-se uma alta significativa do PIB agropecuário, por volta de 8%.
Dois fatores principais ajudam a explicar esse agro mais forte.
Em primeiro lugar, estimativas da Conab (Companhia Nacional de Abastecimento) indicam que a safra 2022/2023 terá um crescimento de 3% de área plantada em comparação com a safra 2021/2022, conjuntamente com uma alta de 14% na produção de grãos na mesma janela de análise, com destaque para as culturas de soja, milho e trigo.
O segundo fator está nos modelos de previsão do fenômeno El Niño/La Niña, apontando que as condições de La Niña devem enfraquecer a partir deste mês e, possivelmente, atinjam estágio de neutralidade durante o segundo trimestre de 2023.
O enfraquecimento da atividade econômica ao longo deste ano tem sido bastante enfatizado pelo novo governo. Objetivamente, começamos a ver as principais consequências desse estrangulamento: a elevada taxa de juros.
Esse receio fez o novo governo abrir discussões sobre a possibilidade de elevação da meta de inflação, decisão que deve ocorrer em algum momento do primeiro semestre deste ano.
Após um clima mais tenso entre governo e Banco Central (BC), que levou Roberto Campos Neto, presidente do BC, ir além dos comunicados, atas e relatórios de inflação do Copom e se pronunciar através do programa Roda Viva, da TV Cultura.
Na verdade, nossa taxa de juros está realmente ficando muito alta porque, após todo o aperto feito, finalmente a inflação passou à uma trajetória cadente e já se encontra pouco mais que o meio do caminho na direção das metas do BC, definidas pelo governo. Ela está se tornando alta, em termos reais, por conta da resposta da inflação indo na direção de suas metas.
Quando olhávamos as expectativas em novembro passado, os agentes já projetavam o início da queda de juros entre abril e maio. Se não tivéssemos introduzido duas importantes incertezas, estaríamos discutindo agora, em fevereiro, se em uma ou duas reuniões a frente do Copom teríamos queda de juros e em que magnitude.
Estou me referindo ao “conflito” trazido pelo presidente Lula entre responsabilidade fiscal e social, duvidando de que a primeira seja pressuposto da segunda, ou seja, a ideia de que, sem estabilidade fiscal, os programas sociais acabam não alcançando aqueles que mais precisam.
E o segundo, o presidente mais uma vez questiona, neste caso, tanto a meta de inflação que o Banco Central deve perseguir, o nível da taxa de juros e a própria autonomia formal do Banco Central.
Me atento ao segundo ponto um pouco mais. Não há país decente no mundo onde o seu Banco Central não seja independente. Portanto, nós, até com um certo atraso, simplesmente estamos nos aproximando das boas práticas do mundo no que se refere as práticas para cuidar da estabilidade de nossa moeda e do próprio sistema financeiro.
Justiça seja feita, o ministro da Fazenda, a ministra do Planejamento e outras importantes autoridades estão: primeiro trabalhando para a nossa trajetória fiscal ser mais razoável, não só já lançaram mão de um ajuste fiscal, como estão trabalhando para adiantar o novo arcabouço fiscal para o mês de março. É inegável o esforço.
Acontece que esses conflitos e incertezas, quando são públicas, acabam reduzindo muito a confiança dos agentes, seja na indústria, serviços, construção civil, entre outras – todas estão em queda relativamente forte. E, do lado da inflação, temos as expectativas, importante indicador da trajetória de inflação à frente, também piorando.
Como sair dessa? Por um lado, temos o setor agrícola muito forte. Mas, de outro, incertezas que atrasam a queda de juros, reduzem a confiança e aumentam as expectativas de inflação.
Sem querer responder a problemas complexos com respostas simples (que em geral são respostas erradas) … mas a resposta é: “back to basics”.
Ou seja, precisamos reduzir as fontes de incerteza. Com um arcabouço fiscal que faça sentido, trazendo a trajetória de nossa dívida gradualmente para baixo, discutir tecnicamente se faz sentido mudar as metas de inflação, mas não deixar isto se estender muito e, principalmente, deixar o Banco Central trabalhar em um ambiente mais estável.
Daí sim, é possível iniciar um processo sustentável de queda de juros a partir de uma inflação que esteja, de fato, indo para as suas metas.
Link da publicação: https://www.infomoney.com.br/colunistas/luiz-fernando-figueiredo/crescimento-confianca-e-arcabouco/
As opiniões aqui expressas são do autor e não refletem necessariamente as do CDPP, tampouco as dos demais associados.