Embora o lado fiscal dificilmente tenha sido um aspecto alarmante nas economias desenvolvidas, para o caso dos EUA parece algo desafiador
InfoMoney
Nos últimos meses, temos observado a economia americana com uma resiliência maior do que a esperada.
As surpresas positivas no PIB aumentaram o otimismo do mercado e implicaram em revisões de crescimento: um exemplo disso é o PIB deste ano, cuja projeção tem sido revista para cima desde meados de agosto de 2023 e atualmente mostra um consenso ao redor de 2,0%, com algumas casas chegando a 2,5% de alta.
O próprio mercado de trabalho ainda se encontra apertado: a taxa de desemprego resiste em subir mais que 3,8% e a geração de vagas se encontra em um patamar relativamente forte – na média, acima de 200 mil vagas mensais.
Conjuntamente, vemos um cenário benigno de inflação, no qual o núcleo de inflação desacelera gradualmente. Parece ser questão de tempo (e um pouco mais de confiança) para que o Fed comece o ciclo de redução de taxa de juros.
Todo esse cenário macro mais favorável não esconde a preocupação mais estrutural com a questão fiscal.
Esse tema tem sido inclusive alertado por Nassim Taleb, trazendo um outro conceito de “cisne branco”, um risco um pouco mais provável de ocorrer. O ponto dele é que o déficit do governo está crescendo de maneira relevante, gerando uma espiral de endividamento e que seria necessário um milagre para evitar os danos causados por esse processo.
O total da dívida pública americana já alcançou 120% do PIB e parece que não vai parar de crescer. Lembrando que até 2020 ela rodava ao redor de 100% do PIB.
De fato, essa discussão é séria e as expectativas não são nada boas. O FMI (Fundo Monetário Internacional), por exemplo, estima que a dívida/PIB alcance 137% até 2028, aumentando em média 3 pontos percentuais ao ano.
O CBO (“Congressional Budget Office”), em relatório mais recente, atualizou suas expectativas para o resultado primário, sendo que esse ano já é esperado um déficit de 2,3% do PIB.
No entanto, o que mais chama a atenção é que, até o horizonte de 2034, o déficit primário deve ficar rodando de forma consistente, em média, ao redor de 2,2% do PIB. Ou seja, até onde a vista alcança, não há nenhum sinal de que o crescimento do endividamento seja um problema, muito menos que é importante fazer um ajuste para conter este crescimento.
A título de curiosidade, a última vez que a economia americana fez superávit primário foi em meados da década de 1990.
O último ruído envolvendo esse lado fiscal ocorreu no fim de janeiro: o adiamento (pela terceira vez em menos de quatro meses) do shutdown do governo para o início do mês de março.
Deve ser um assunto que ainda trará outros ruídos, dado que neste ano veremos a eleição presidencial e existe uma falta de convergência dentro do Congresso para se discutir uma solução efetiva.
Embora o lado fiscal dificilmente tenha sido um aspecto alarmante nas economias desenvolvidas, para o caso dos Estados Unidos parece algo desafiador.
Primeiro porque, com exceção dos períodos de crise financeira de 2008 e a pandemia, os números fiscais nunca se deterioraram tanto quanto agora. E segundo pois esse tema poderá representar um driver para o enfraquecimento do dólar e, consequentemente, um aumento do prêmio de risco na rolagem da dívida pública.
País desenvolvido tem muito mais crédito “na praça”. Mas sabemos que, quando cresce o medo, o investidor para instantaneamente de comprar. É bom não flertar com isso – em quase todos os casos “deu ruim”!
Este artigo tem a co-autoria do economista da Jive Investments Luan Takada.
Link da publicação: https://www.infomoney.com.br/colunistas/luiz-fernando-figueiredo/um-desafio-estrutural/
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