Estadão
Os dados do PIB recém divulgados reforçaram um padrão na economia: o setor de serviços lidera o crescimento, enquanto a indústria segue bem atrás (em particular a manufatura), e a agricultura tem uma dinâmica própria. Isto não ocorre por acaso: é o resultado de uma economia que opera próxima ao pleno emprego em conjunto com a forte expansão do gasto público e o desempenho ruim da produtividade, à exceção da agricultura.
No período, a taxa de desemprego, ajustada ao padrão sazonal, se encontrava em 7,5% (caindo para 7,2% em abril), patamar inferior às estimativas da taxa “natural” de desemprego. A aceleração recente dos salários nos últimos trimestres parece consistente com esta tese, mas não é a única evidência a respeito.
Observamos expansão acelerada do gasto público, com ênfase nas transferências às famílias (Previdência, BPC, Bolsa Família, etc.), que cresceram 17% acima da inflação do final de 2022 para cá. Isto tem impulsionado o consumo e a demanda interna, cujo crescimento no primeiro trimestre atingiu 1,7%, o dobro do PIB.
Parte desta demanda se dirige a bens, outra a serviços. Se houvesse folga em termos de capacidade na economia, em particular no que se refere à mão de obra, a produção poderia crescer em ambos os segmentos, sem maior assimetria.
Quando, porém, a economia opera a pleno emprego, nem todos os setores podem se expandir. Como não é possível importar serviços, a demanda maior precisa se materializar em elevação correspondente da produção e emprego no setor. Consequentemente, preços de serviços devem se elevar relativamente ao preço de bens, para incentivar produção adicional. No caso, o IPCA mostra o preço de serviços aumentando perto de 5% em 12 meses contra 0,4% de industriais.
Por outro lado, a demanda por bens pode ser saciada pelo aumento das importações, observada nos dados da balança comercial da indústria de transformação, mas não na agricultura, graças a seu crescimento da produtividade da ordem de 5% ao ano. Portanto, a expansão da demanda interna não se traduz em mais produção industrial, e sim em importações crescentes, também aparente nos dados do PIB.
Há, pois, descompasso também entre a política de gastos e a política monetária. A prática de expandir a demanda em ambiente de pleno emprego tem consequências inflacionárias, que já parecem estar nas contas do BC. O pé no acelerador do Tesouro exige o pé no freio do BC, expresso numa taxa básica de juros inalterada já a partir da próxima semana.
Link da publicação: https://www.estadao.com.br/economia/alexandre-schwartsman/pe-no-acelerador-do-tesouro-exige-pe-no-freio-do-banco-central/
As opiniões aqui expressas não refletem necessariamente as do CDPP, tampouco as dos demais associados.