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Entrevista/Meirelles: Problema de Lula com autonomia/BC é não poder exonerar banqueiro central

Broadcast

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva precisa ser lido como um político quando o assunto é autonomia do Banco Central, disse em entrevista ao Broadcast o ex-presidente da autarquia durante os dois primeiros mandatos do petista, Henrique Meirelles. De acordo com o ex-banqueiro central, Lula compreende a importância de um BC autônomo, tanto que lhe conferiu total liberdade para fazer um bom trabalho ao longo dos oito anos em que ficou à frente da autarquia. A questão é política porque, como político que é, o que incomoda o petista é a ausência da prerrogativa do presidente da República, que teve o voto da população, para exonerar o presidente do BC caso algo dê errado. Meirelles diz ainda que a unanimidade no último Copom sinalizou compromisso do BC com o combate à inflação após a saída de Roberto Campos Neto.

Leia abaixo os principais trechos da entrevista.

Broadcast: O presidente Lula citou recentemente o seu nome, alegando que o senhor foi o banqueiro central que mais teve autonomia. Por que a formalização desta autonomia incomoda tanto o presidente?

Henrique Meirelles: De fato, eu tive autonomia para trabalhar. Por isso o presidente comentou. Logo no convite eu combinei com ele que ia precisar de autonomia para fazer um bom trabalho. Ele aceitou e tudo deu certo.

Broadcast: O presidente fala desta autonomia e o senhor confirma. É a formalização que preocupa o presidente Lula?

Meirelles: É isso! Lula é um político e precisa ser lido como tal. Ele me deu autonomia para trabalhar e nunca interferiu. Mas ele se sentia confortável porque tinha a prerrogativa de me exonerar a qualquer hora caso as coisas não dessem certo. Ele é um político que teve a maioria dos votos nas urnas e não se sente confortável em não poder demitir o presidente do BC.

Broadcast: Mas o que o senhor pensa sobre esta questão da formalização da autonomia do BC?

Meirelles: Independentemente de eu ter tido liberdade para trabalhar, sempre defendi a formalização da autonomia porque um banco central não pode ficar sujeito às vontades de um presidente, seja ele quem for. O BC tem de ser técnico para cumprir sua missão de manter a inflação sob controle e a estabilidade do sistema financeiro. O controle da inflação dá poder de compra à população e a estabilidade financeira dá segurança para os investimentos de longo prazo.

Broadcast: Depois de uma divisão que deu o que falar no mercado em maio, o Copom foi unânime em manter a Selic nos atuais 10,50%. Como o senhor leu a decisão?

Meirelles: A decisão, me parece, foi uma decorrência normal do fato de que os modelos do BC são muito desenvolvidos em termos de prever os diversos cenários de inflação e Selic. A unanimidade agora foi muito positiva porque sinaliza que o Copom deve continuar com foco na inflação mesmo depois da saída do presidente Roberto Campos Neto.

Broadcast: Em sua avaliação, havia necessidade de se criar um ruído tão alto no mercado por causa de quatro votos por corte de 0,5 ponto porcentual no Copom anterior?

Meirelles: Claramente, naquela reunião, os que votaram pelo corte de 0,50 ponto achavam que era necessário seguir o forward guidance. Julgaram que o forward guidance era mais importante. A reação do mercado se deu em função do temor de que os votos dissidentes teriam sido dados por motivações políticas.

Broadcast: Em sua opinião, houve de fato quebra de credibilidade e agora, por causa da unanimidade, a retomada desta credibilidade?

Meirelles: Não houve quebra da credibilidade. Houve sim, naquele momento, uma preocupação do mercado com a possibilidade de os diretores que votaram por 0,50 ponto estivessem se alinhando politicamente. Mas não chegou a arranhar a credibilidade do BC. E agora, com a unanimidade do Copom na manutenção da Selic, veio a sinalização de que o comitê vai perseguir a meta de inflação.

Broadcast: A posição do BC acaba, de alguma forma, apoiando os ministros da Fazenda e Planejamento para defender junto ao governo redução de gastos?

Meirelles: Como já disse, a função do Banco Central é manter a inflação sob controle e a estabilidade financeira. Mas, sem dúvida, apesar de não ser este o objetivo dele, na medida em que justifica que parte de sua atuação está associada ao fiscal, o BC acaba sim apoiando os ministros da Fazenda [Fernando Haddad] e a ministra do Planejamento [Simone Tebet].

Broadcast: No âmbito fiscal, o senhor acha que as novas metas de primário serão alcançadas?

Meirelles: Se o governo e o Congresso aceitarem as medidas que estão sendo propostas pelo ministro da Fazenda, eu acho que as novas metas fiscais poderão ser alcançadas.

Broadcast: Como o senhor vê a tentativa do ministro Haddad em reonerar a folha de pagamento dos 17 setores e a nova DRU [Desvinculação de Receitas da União]?

Meirelles: Eu não gostaria de discutir medidas específicas. O que eu acho é que se o que está sendo proposto pelos ministros da Fazenda e do Planejamento for aceito, podemos melhorar o fiscal.

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