Em entrevista, ex-presidente do Banco Central defende a importância da autonomia formal da instituição para que o Brasil cresça
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Em seu livro, o senhor diz que a maior qualidade de um bom presidente de banco central é ter coragem. Por quê? A questão básica é que um banco central não pode atuar querendo popularidade a todo momento. Para tomar as medidas corretas, é necessário coragem. A atuação da autoridade monetária, por definição, gera críticas. Um excelente exemplo é o período de Paul Volcker no comando do Federal Reserve. Quando assumiu, ele elevou rapidamente a taxa básica de juros dos Estados Unidos de 11% para 21% ao ano. A atividade econômica caiu bruscamente. Houve passeatas contra o Volcker, uma coisa inédita no país. Mas a inflação, que era de 12,5% em 1980, caiu para 3,8% em 1982, e a economia voltou a crescer. São fenômenos muito difíceis de explicar em um debate público. Então, é normal que as pessoas não gostem.
Diante das fortes críticas de Lula aos juros altos, será difícil para o próximo presidente do BC, Gabriel Galípolo, ter essa coragem? Eu acho que não. De uma certa maneira, ele terá até uma vantagem em relação à minha época, que é o fato de que o Banco Central hoje possui independência legal. Isso dá uma segurança muito maior do que no meu tempo para fazer o que é certo e necessário.
O senhor relata no livro que, em meados de 2007, Lula lhe telefonou pedindo que o BC cortasse os juros. A falta de autonomia legal expunha o BC a essas situações? Sim, mas tem um ponto muito importante. Como o Banco Central não era legalmente autônomo, eu lembrei ao Lula que, quando ele me convidou para o cargo, nós dois fizemos um acordo de que eu atuaria com independência, porque só assim seria possível resolver os problemas que impediam o país de crescer. Naquele dia em que ele me pediu para baixar os juros, eu falei: “Vou cumprir a minha parte do acordo e não vou cortar, e o senhor tem a prerrogativa de me exonerar, se quiser”. Quando o país começou a crescer bastante, ficou claro que a autonomia não era um capricho meu, mas, sim, um instrumento para tomar as melhores decisões, baseadas em dados técnicos, e não políticos. Aquela foi a única vez em que Lula me ligou.
O senhor também destaca a necessidade de alinhamento das políticas monetária e fiscal. Elas estão alinhadas neste governo? Se a política fiscal é um pouco mais expansiva, isso significa que é preciso ter uma taxa de juros um pouco mais alta para equilibrar. Agora, é positivo e relevante que tenha sido aprovado o arcabouço fiscal, porque mostra que há consciência do problema do aumento de despesas. O arcabouço é mais flexível que o teto de gastos e cria muitas exceções, mas o fato concreto é que ele coloca uma certa restrição fiscal, o que vai no caminho correto. Mas, evidentemente, a taxa de juros de equilíbrio da economia se acomoda um pouco para cima. É possível, porém, trabalhar com isso, tanto que o país está crescendo. É verdade que as reformas estruturais anteriores ajudam. Elas não foram desmontadas. Não se voltou atrás na reforma trabalhista, por exemplo, nem no novo marco legal do saneamento.
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