Folha
Há o objetivo do presidente Lula de recuperar para a economia brasileira o grau de investimento, que foi perdido em 2016. Originalmente concedido em 2008 e 2009 pelas três principais agências de rating, o grau de investimento é importante pois permite que diversos fundos institucionais, como fundos de pensão de fora do Brasil, possam comprar títulos de dívida do governo brasileiro.
Mas há um efeito real? O Tesouro Nacional apresenta a série de evolução da dívida pública pela origem do detentor. É possível acompanhar a evolução da participação dos estrangeiros no carregamento da dívida brasileira.
Entre 2007 e meados de 2015, a participação cresce persistentemente, saindo de 1,7% para 20,8%. Em seguida, inicia uma queda, até atingir os atuais 10,1%.
Ou seja, se conseguirmos recuperar o grau de investimento, tudo sugere que voltaremos a ter 20% da dívida pública nas mãos de não residentes, o que contribuirá para a redução dos juros na economia brasileira e, evidentemente, para que o câmbio seja mais valorizado.
De fato, eu e meu colega Lívio Ribeiro, do FGV Ibre, calculamos o valor de equilíbrio de longo prazo para o câmbio real, com base em fundamentos da competividade da economia brasileira com o comércio internacional.
No período anterior a 2016, o câmbio observado foi na média mais valorizado do que o dado pelos fundamentos de comércio internacional. Para o período subsequente, ocorre o contrário: o câmbio observado é mais desvalorizado do que o dado pelos fundamentos de comércio internacional.
Finalmente, ao verificar a série da IFI (Instituição Fiscal Independente) de superávit primário estrutural, observamos uma queda continuada desde 2006, com forte piora em 2013 e 2014 e seguidos déficits para o período subsequente.
A incapacidade de fazermos um ajuste fiscal mais duradouro a partir de 2015 —incapacidade que segue até hoje—, associada à perda do grau de investimento, consolidou um câmbio corrente permanentemente mais desvalorizado do que o de equilíbrio de longo prazo e uma capacidade menor de financiarmos o déficit público por meio de investidores internacionais que corram risco em reais comprando dívida interna do Tesouro Nacional.
Lula está correto em priorizar a recuperação do grau de investimento. No entanto, sem uma sinalização fiscal mais consistente, não avançaremos.
Não há muito tempo. A velocidade de acumulação da dívida pública tem crescido. Provavelmente, no quadriênio de Lula 3 o crescimento da dívida será de 14 pontos percentuais do PIB, e a inflação dá sinais de que voltará a incomodar.
Na semana passada, tivemos a divulgação da prévia da inflação de outubro. Tudo sugere que o impacto positivo que ainda se fazia sentir da fortíssima reversão dos choques da pandemia sobre os serviços terminou.
De agora em diante, a dinâmica da inflação de serviços acompanhará a atividade, que se encontra a plena carga. Veremos, como foi o caso em outubro, uma aceleração da inflação de serviços.
O tempo de Lula está correndo. A escolha política de inverter a ordem natural do ciclo político da despesa pública —iniciar o governo com o pé no acelerador do gasto público— começa a cobrar seu preço.
Link da publicação: https://www1.folha.uol.com.br/colunas/samuelpessoa/2024/10/grau-de-investimento-e-o-custo-de-capital.shtml
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