Do Pix ao Cadastro Único, livro reúne experiências que deram certo no Brasil e podem inspirar novas iniciativas
Folha
O ex-diretor do Banco Central que testemunhou a implantação do Pix, o uso do Cadastro Único como instrumento para estruturar programas sociais e a implementação das câmeras corporais pela polícia (e como elas não conseguiram avançar em todos os estados).
Experiências de grande impacto social que podem servir de modelo para outras iniciativas fazem parte do livro “Políticas Públicas Bem-Sucedidas: Lições para Promover o Bem Comum”, organizado pelo colunista da Folha Marcos Mendes.
“Colocar de pé uma política pública bem-sucedida é uma empreitada bastante difícil. É preciso fazer um diagnóstico adequado do problema a ser resolvido, formular possíveis diferentes soluções, verificar a eficácia, aumentar a escala da política posteriormente, evitar captura da política pública por interesses eleitorais, entre vários outros desafios”, relata Mendes, que é pesquisador associado do Insper.
O volume é uma espécie de negativo da imagem apresentada em um outro livro lançado há pouco mais de dois anos, também sob organização do pesquisador: “Para Não Esquecer: Políticas Públicas que Empobrecem o Brasil”, em que especialistas revisitavam medidas fracassadas —e apontavam os cuidados que o país deve tomar para não repetir erros do passado.
A obra, que conta com a participação de 23 autores, também mergulha no Plano ABC (Agricultura de Baixo Carbono) e nos modelos de controle e prevenção do desmatamento na amazônia.
Para Mendes, os exemplos relatados no livro permitem um aprendizado importante da relevância do federalismo: alguns estados tentam uma política e fracassam, outros fazem melhor e prosperam.
“A existência de vários governos lidando com um mesmo problema, ao mesmo tempo, permite uma experimentação que será benéfica para todos, à medida que as estratégias bem-sucedidas sejam copiadas pelos demais”, complementa.
Para o professor do Insper Sandro Cabral, o subtítulo do livro poderia ser “sí, se puede”. “Temos coisas boas que foram feitas, que têm seus limites, mas apontam para configurações que podem explicar o sucesso ou eventualmente o fracasso da determinadas políticas.”
É de autoria dele o capítulo que faz um balanço das duas décadas de PPPs (Parcerias Público-Privadas) no país, desde a primeira versão da lei, concebida em 2003 pelo hoje ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e depois alterada pelo Congresso e publicada no fim de 2004.
“No caso das PPPs, o ponto de partida para um projeto de sucesso é garantir um bom desenho. Se ela for bem desenhada, tende a ser executada de forma correta, e as duas ações dependem de competências que estão tanto no setor público quanto no setor privado”, diz Cabral.
Ele destaca como a ferramenta foi se tornando uma alternativa para viabilizar aportes em infraestrutura, considerando um cenário que não pode ser ignorado, de restrições fiscais e demanda por maior eficiência no gasto público.
O pesquisador acrescenta que o número de contratos no país mais que dobrou desde 2016 e que, embora metade tenha sido firmada no Sudeste, 28% foram assinados na região Nordeste, incluindo estados que têm sido governados pela esquerda nos últimos anos.
Partindo desse ponto de vista, os autores propõem centrar o debate em um lugar além da discussão de público versus privado —os exemplos disponíveis permitem que a sociedade vá além de debates ideológicos.
“É interessante ver como as parcerias ajudam a acabar com o mito de que elas são um negócio da direita. Os estados do Nordeste, com governos ditos de esquerda, abraçaram essa agenda, com Bahia, Pernambuco e Ceará avançando em projetos de água, conectividade, metrô, estádio de futebol.”
Como exemplos positivos, ele destaca a construção e operação de unidades de ensino da rede municipal de Belo Horizonte, em que o poder público se concentrou nas atividades pedagógicas e repassou as demais obrigações para o parceiro privado.
Já o exemplo do sistema metroviário de Salvador, na visão de Cabral, mostra que o contrato continha um mecanismo interessante que incentivava o agente privado a acelerar as obras sem comprometer a qualidade da execução
Perto dali, o projeto “Piauí Conectado” foi bolado pelo estado nordestino para expandir a infraestrutura de transmissão de dados, que acabou ajudando a aumentar a eficiência de órgãos públicos.
Por outro lado, Cabral ressalta que o caminho do fracasso, no caso das parcerias entre público e privado, é tentar tocar muitos projetos ao mesmo tempo.
Outro erro seria gastar energia e capital político em propostas que já se revelam desde o início inviáveis do ponto de vista financeiro ou jurídico.
Uma modelagem financeira ruim e a falta de liderança política que demonstre estar comprometida com a agenda também ajudam a sepultar propostas de parceria.
“O trabalho desnecessário só gera calor. No caso do Brasil, de exemplos que não deram certo, temos a política de segurança pública e a política prisional, que, na média, não dão certo e há elementos de gestão nisso”, diz Cabral.
“Há toda uma literatura de avaliação de resultados de políticas públicas e um um esforço do Ministério do Planejamento hoje nesse sentido. O que a gente precisa é ter essa cultura disseminada, com gente treinada, e as nossas classes políticas e empresariais precisam reconhecer a importância da avaliação.”
Link da publicação: https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2024/11/boas-politicas-publicas-derrubam-mitos-de-esquerda-ou-direita-diz-pesquisador.shtml
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