Estadão
Era, até certo ponto, previsível, mas, mesmo assim, a resposta do mercado financeiro ao pacote de “ajuste” fiscal do governo foi brutal. O dólar ultrapassou R$ 6,00, juros futuros saltaram, tanto para o curto como para o longo prazo, e a Bolsa caiu. Não houve ativo financeiro que passasse ileso pela tempestade pós-anúncio.
Em primeiro lugar porque não há corte de gastos na promessa de corte de gastos. O que o governo alardeou não representa despesa mais baixa em relação aos níveis ora observados, mas sim – se tudo der certo – um aumento menor do gasto obrigatório nos anos à frente. Por exemplo, o “corte” de R$ 30 bilhões prometido para 2025 implicaria redução da despesa orçada para aquele ano de R$ 2,389 trilhões para R$ 2,359 trilhões, mas bem acima dos R$ 2,234 trilhões a serem observados em 2024.
O mesmo se aplica para 2026 e depois, ou seja, o tal “corte” de R$ 70 bilhões nos primeiros dois anos de vigência das medidas na verdade embute aumento de despesas. Na prática, o que as medidas propostas permitem é certo aumento da flexibilidade do orçamento, hoje muito engessado, desenhado de modo a abrir espaço para maiores gastos discricionários em 2026 e assim aumentar as chances eleitorais do atual governo.
Isto é, se o impacto for o prometido, porque na apresentação oficial das medidas não há qualquer indicação dos cálculos que embasariam os números oficiais. Trata-se de questão de fé, não de razão, problema apontado pelo craque Marcos Mendes. Fora, é claro, eventuais dificuldades quanto à aprovação pelo Congresso, de quem esperam, por exemplo, redução voluntária de cerca de R$ 7 bilhões em emendas parlamentares. Boa sorte com isto…
À parte a mágica orçamentária do ministro, houve também o anúncio de uma reforma do Imposto de Renda Pessoa Física, que consistiria na isenção do IRPF para quem ganha até R$ 5 mil, a ser compensada pela criação de mecanismos para elevação do IRPF para classes mais elevadas de renda.
O silêncio sobre como se daria a compensação trai a ausência de qualquer consideração mais sólida que norteasse a proposta. Ficou óbvio que as medidas foram anunciadas não por razões econômicas, mas para tentar minimizar o impacto na opinião pública de um pacote pífio. Isto sugere que não há qualquer disposição para promover de verdade o necessário ajuste das contas públicas.
Assim, a dívida seguirá em alta, trazendo com ela maiores riscos, dólar mais caro, inflação crescente e os demais cavaleiros do Apocalipse. Brincar de mágica dá nisto.
Link da publicação: https://www.estadao.com.br/economia/alexandre-schwartsman/magica-mr-ministro/
As opiniões aqui expressas não refletem necessariamente as do CDPP, tampouco as dos demais associados.