Estadão
O BC tem demonstrado incômodo considerável com a piora das expectativas de inflação, não apenas as obtidas pela pesquisa Focus, mas também as “medidas por diferentes instrumentos e obtidas de diferentes grupos de agentes”.
Há motivos para preocupação. A persistência de expectativas inflacionárias muito acima da meta, mesmo para horizontes relativamente longínquos, como 2026 (4,3%) e 2027 (3,9%), sugere que a credibilidade do BC não está somente arranhada, mas seriamente ferida.
Haveria, em tese, tempo mais do que suficiente para a política monetária atuar em ambos os horizontes, mais distantes do que as defasagens normalmente associadas à política, ou seja, um BC determinado conseguiria, pelo manejo apropriado da taxa de juros, aproximar a inflação da meta. Mesmo que não ficasse exatamente em 3%, deveria, ao menos, oscilar em torno deste patamar.
A descrença dos “diferentes grupos de agentes” a este respeito deve refletir, portanto, a visão que faltaria ao BC precisamente esta determinação. Ou, ainda pior, que já nos encontraríamos em situação na qual a eficácia da ação do Copom para conter a inflação estaria extraordinariamente reduzida (a tal “dominância fiscal”).
O segundo motivo refere-se ao efeito das expectativas inflacionárias sobre os preços e salários correntes. Agentes econômicos, ao reajustar preços e salários, não reagem apenas às condições correntes de demanda e oferta. Crucialmente, precisam levar em conta qual será a inflação durante o período em que seus preços estarão fixados. Caso seja muito alta, perderão valor rapidamente, como ocorre hoje com os salários.
Assim, expectativas de inflação muito acima da meta induzem empresas e trabalhadores a reajustarem hoje preços e salários de forma mais vigorosa do que fariam com as expectativas controladas. Neste cenário, para conter a inflação, o BC precisa subir ainda mais o juro, portanto reduzir ainda mais o crescimento, do que seria o caso com as expectativas próximas à meta. O custo, portanto, de reduzir a inflação se torna mais alto, em particular no que se refere ao aumento do desemprego.
A complicação final diz respeito à provável reação do governo a qualquer tentativa séria de trazer a inflação de volta à meta. Qualquer sinal de desaceleração da economia que possa ameaçar os planos eleitorais do governo deve provocar medidas no sentido contrário, tanto de novos gastos como estímulos ao crédito que impeçam este fenômeno.
Pensando bem, neste contexto, quem acreditaria em inflação na meta?
Link da publicação: https://www.estadao.com.br/economia/alexandre-schwartsman/por-que-nao-creem/
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