A violência tomou conta dos estádios de futebol, as organizadas estão mais preocupadas em brigar do que torcer, e são frequentes as demonstrações de racismo contra jogadores
Estadão
Comecei a frequentar estádios de futebol muito cedo, carregada por um tio, junto com meus irmãos e primos. Era literalmente a “kombi dos botafoguenses”. Uma outra época. As crianças iam com tranquilidade, as torcidas se encontravam na descida da rampa do Maracanã, o busto do Garrincha era reverenciado por todos, independentemente da cor da camisa.
Hoje, é diferente. A violência tomou conta dos estádios. As organizadas estão mais preocupadas em brigar do que em torcer. A cada morte de um torcedor, os mandantes do futebol brasileiro gritam indignados – por longas 48 horas.
São frequentes as demonstrações de racismo contra jogadores. Esta semana foi com o time sub-20 do Palmeiras. A entrevista do garoto Luighi foi comovente. Aos prantos, mostrou seu cansaço e tristeza de ver ataques racistas tratados com naturalidade.
Há mais de 20 anos eu acompanho gestão do futebol. Muita coisa mudou. A nossa seleção não assusta mais, e os craques vão embora do País assim que podem. Do lado positivo, temos a melhora da gestão de alguns poucos clubes, seja com as SAFs, seja por conta de algum cartola bem-intencionado.
A CBF e a Conmebol estão onde sempre estiveram. Cegas à péssima qualidade da arbitragem – que conseguiu desmoralizar o VAR –, ignoram os estádios e os gramados indecentes e ficam indiferentes à violência e ao racismo.
As soluções propostas pelas federações igualam a vítima ao agressor. Por exemplo, em casos de vandalismo de uma torcida a punição obriga o time agressor a jogar com estádio vazio, prejudicando o adversário que não tem nada a ver com isso.
Para os amantes do futebol, os jogos da Champions são imperdíveis. Parece outro esporte. E, além da qualidade dos times, os gramados são ótimos; a arbitragem, boa; e os estádios, modernos e confortáveis. Mas, mesmo por lá, o racismo é tolerado. Que o diga Vini Jr que, em atitude individual, enfrenta com coragem a covardia de quem o xinga e de quem passa pano.
No caso Luighi, usar a desculpa de que o Paraguai não criminaliza racismo é lavar as mãos. O clube faz uma declaração e recrimina o torcedor, e segue em frente. Sabe que não vai sobrar para ele.
Notinhas de protesto da Fifa ou da CBF não adiantam nada. Já passou da hora de os times serem punidos pelas atitudes de seus torcedores. O Palmeiras sair da competição em protesto, como foi sugerido, não faz sentido. O time que permite a violência deve ser realmente punido, trabalhando de verdade para coibir futuras demonstrações.
A cada gesto imitando macacos eu lembro do meme: “É raro, mas acontece muito”. Até quando?
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