Com tanta disfuncionalidade acumulada, esperava-se uma reformulação para valer; não veio
Estadão
O ministro Silveira apresentou, enfim, sua proposta para o setor elétrico. É baseada no tripé justiça, liberdade e equilíbrio. Quase uma Revolução Francesa. Faz sentido; afinal, o que não falta neste país é Maria Antonieta.
Desde a malfadada MP 579/2011, os problemas de operação do setor elétrico se acumulam. Boa parte do que foi apresentado estava no PL 414/2018, que procurava corrigir os erros de Dilma, mas que não andou.
O relator era o ex-ministro Fernando Coelho, que, ao contrário de Silveira, entende do assunto. E, nestes oitos anos, remendos foram feitos na operação do sistema para lidar com a entrada de fontes intermitentes – eólica e solar – na matriz.
Com tanta disfuncionalidade acumulada, esperava-se uma reformulação para valer. Não veio. A razão seria crise institucional. Mas não se faz política pública sem ousadia.
Há três objetivos claros na proposta: reduzir o desequilíbrio entre consumidores livres e cativos com a abertura do mercado, alterar o volume e alocação de subsídios e ampliar a tarifa social.
Os técnicos do MME estão de parabéns por conseguir, finalmente, emplacar mudanças tão evidentes e necessárias. Mas os consumidores estão frustrados: o mais injusto dos subsídios, a geração distribuída, permanece intocável.
A novidade é a ampliação da faixa de isenção dos usuários de baixa renda. Essa parece ser a motivação política para a “celeridade” do anúncio. O governo precisa recuperar sua popularidade; e Silveira, ganhar a queda de braço com Alcolumbre. Oportunismo político ou não, é uma boa ideia. Pode até reduzir a inadimplência das distribuidoras.
Mais uma vez, garantir segurança jurídica é a promessa. Palavras ao vento. A proposta de abertura de mercado e as novas regras tarifárias chegam em plena renovação de concessões, que estão sendo feitas com base no decreto de junho de 2024.
Para piorar, ainda nesta semana reguladores apresentaram novos condicionantes à renovação de contratos de algumas distribuidoras. Como em toda mudança que mexe – corretamente – em incentivos que não se justificam mais, muita discussão jurídica ainda virá pela frente sobre direitos adquiridos, previsibilidade e retorno esperado em projetos de geração. O investidor do setor elétrico é, antes de tudo, um forte.
Só não dá para aprovar o projeto pela metade. Alguém terá de pagar pela redução das desigualdades. E não será o Tesouro.
Andei ouvindo Lulu Santos nesta Páscoa e, desde o anúncio feito pelo ministro Silveira, eu não consigo parar de cantar: “Não vou dizer que foi ruim, também não foi tão bom assim”.
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