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O diabo na rua, no meio do redemunho

Estadão

Em evento recente do PT, o ministro da Fazenda afirmou: “O ano que vem nós vamos dar trabalho para essa extrema direita escrota (sic) que está aí (…). Vamos ver de novo o presidente Lula subir a rampa do Palácio do Planalto.”

À parte a linguagem serena, digna de um Ciro Gomes, por coincidência também um político alçado ao comando da economia nacional, a fala de Haddad apresenta problemas ao menos em duas dimensões: econômica e institucional.

No que se refere à gestão da economia, ela remete a declaração no mesmo sentido cometida pela então presidente Dilma Rousseff em 4/3/2013, ao proclamar que “podemos fazer o diabo quando é hora de eleição”.

Todos nos lembramos deste demônio em particular: para vencer a eleição de 2014, Dilma não hesitou tanto em arrasar as finanças públicas como em falsificar as contas do governo, processo que ficou conhecido como “pedalada fiscal”, amplamente registrado, por exemplo, por Leandra Perez e João Villaverde. A recessão de 2014-16, por algumas métricas a mais severa da história recente do país, resultou em larga medida dos excessos então cometidos “quando é hora de eleição”.

Os paralelos ficam evidentes quando, em momento de queda da popularidade de Lula, o governo anuncia várias medidas de estímulo que ampliam os gastos públicos. Alguns, inclusive, embora originalmente concebidos para “correr por fora” do orçamento, terão — por força da pressão dos órgãos de controle — que ser incluídos, a contragosto, na peça orçamentária. Não é por outro motivo que a imprensa já relata discussões para afrouxamento da meta fiscal, além do manjado truque do abatimento de despesas.

Por mais graves, contudo, que sejam os problemas fiscais associados à fala do ministro, empalidecem face à deterioração institucional que deles emana.

O ministro da Fazenda é, dentre os auxiliares diretos do presidente, o principal responsável pela estabilidade econômica. Quando revela que tal objetivo se subordina ao plano de reeleição de Lula desnuda quão frágeis são as bases institucionais sobre que se assenta a política econômica, aliás, o mesmo pecado em que incorreram Paulo Guedes, ao propor e apoiar as PECs dos Precatórios ao final de 2021 e a Kamikaze em meados de 2022, e, claro, o “ciclista” Guido Mantega em 2010 e 2014.

Conclui-se, portanto, que o objetivo da política econômica não é promover o crescimento sustentável do país, mas gerar condições que facilitem a reeleição do presidente, independentemente dos custos que isso possa causar.

O diabo já está feito.

Link da publicação: https://www.estadao.com.br/economia/alexandre-schwartsman/o-diabo-na-rua-no-meio-de-redemunho/

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Sobre o autor

Alexandre Schwartsman