Na semana passada, o dólar caiu mais um pouco, num processo de enfraquecimento que vem desde o começo do ano
Estadão
Alan Greenspan costuma dizer que o câmbio serve para manter a humildade dos economistas. Fazer previsões sobre a oscilação de moedas é sempre arriscado, pois muitos fatores interferem no valor. A melhor forma que o mundo criou para lidar com o câmbio é deixá-lo oscilar livremente, de acordo com as leis de mercado. Economias saudáveis não têm problemas com isso.
Abordo este tema não para falar do Brasil, que já teve muitos problemas com câmbio, mas da economia global. Na semana passada, o presidente do Banco Central da China, Pan Gongsheng, defendeu um sistema financeiro internacional baseado em várias moedas de países mais ricos, não apenas no dólar, como acontece hoje. O dólar é a moeda de referência em trocas comerciais no mundo.
Seria uma mudança radical. Gongsheng disse que a desvalorização recente do dólar pode contaminar todo o sistema financeiro internacional. Na semana passada, o dólar caiu mais um pouco, num processo de enfraquecimento que vem desde o começo do ano. É comum autoridades de diversos países falarem da conveniência de uma moeda mais fraca em relação a outras moedas para tornar os preços de seus produtos mais competitivos. Com isso, o déficit comercial daquele país poderia ser reduzido.
Quem tem poder para interferir diretamente no câmbio na maioria dos países, para obter esse efeito positivo para as suas exportações, é o Banco Central. A China mantém um controle de câmbio há anos, que determina a cotação de sua moeda, mas é uma ditadura, um caso muito particular.
O Brasil tentou controlar o câmbio em algumas ocasiões e teve problemas. A flutuação do câmbio foi instituída no Brasil em 1999, e levou o País à normalidade. Quando assumi o BC, em 2003, implantamos a liberdade cambial: revogamos as normas que dificultavam o envio e o recebimento de recursos. Houve enorme resistência, mas os benefícios foram grandes. A Argentina controla seu câmbio há anos, e sua difícil situação econômica há décadas é uma mostra das consequências negativas disso.
Uma das consequências das tarifas comerciais adotadas pelos EUA é a desvalorização cambial, mas isso não é uma intervenção no câmbio. Os EUA seguem sendo o país que tem a economia mais liberal do mundo. Diversos países fizeram intervenções cambiais para reduzir o déficit comercial, mas isso pode trazer efeitos negativos. A proposta chinesa teria efeitos importantes, como o dólar ser questionado como moeda de referência no sistema financeiro internacional. Além disso, seria uma medida de difícil implementação e teria também desvantagens importantes. Mas isso será tema de outra coluna.
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