Folha
Trump tem fechado acordos em que os Estados Unidos impõem uma tarifa de importação e a contraparte não tarifa os americanos. Foi assim com o Japão e com a União Europeia. É necessário sabermos os detalhes dos acordos, as letras miúdas, mas tudo sugere que há, sim, certa assimetria. Somente com a China parece não haver essa discrepância.
Esse desfecho não é surpreendente. Pela escala da economia americana e por ter um déficit estrutural, a perda de bem-estar resultante de uma guerra comercial é menor para os EUA.
As simulações sugerem que, em uma guerra comercial aberta —todos contra todos—, as perdas dos EUA são bem menores do que as dos demais países. Os EUA perdem em bem-estar o equivalente a 1% do consumo. A América do Sul perde 3%, e a Europa, de 7,5% a 10%. A China perde de 13% a 20%.
Os autores do estudo, publicado no volume 4 (de 2014) do Handbook of International Economics, consideram, em suas simulações, a América do Norte conjuntamente. O estudo é rico o suficiente para considerar competição imperfeita e a existência de cadeias globais de valores, além de heterogeneidade entre as empresas dentro de um mesmo país.
O ponto importante a reter é que os EUA têm um maior poder de barganha. E o está exercendo. É essa a explicação para os acordos com o Japão e a União Europeia.
O maior poder de barganha, no entanto, parece que não tem funcionado para a China. Também esperado. O poder de barganha segue da perda de bem-estar em caso de guerra tarifária aberta. Ora, perda de bem-estar é uma ameaça crível entre democracias. Não é o caso chinês. Xi não terá de enfrentar eleições nos próximos anos. Merkel já havia incorrido no mesmo erro com Putin: vínculos comerciais não moderam ditadores.
Trump também tem sido bem-sucedido em seu empenho em desvalorizar o dólar. A ver os efeitos de longo prazo que colherá. Mas em um primeiro momento ajuda na competitividade da economia, um dos seus objetivos mais importantes.
Então podemos afirmar que Trump está ganhando? Penso que não. Há sinais de que a desaceleração chegou. O crescimento da economia americana no primeiro semestre foi de 0,6%, ou 1,2% se anualizarmos a taxa. A economia antes de Trump crescia a 2,5% a 3%.
Parte da desaceleração é fruto da política monetária que finalmente parece bater na demanda. O crescimento do consumo no primeiro semestre foi de somente 1%, já considerando a taxa anualizada. Antes de Trump, rodava em média a 3%.
De qualquer forma, o choque inflacionário fruto da política tarifária, que começa a aparecer nas estatísticas —de março a junho a inflação ao consumidor acumulada em 12 meses cresceu 0,3 ponto percentual—, atrasará e reduzirá a intensidade do ciclo de queda de juros.
Mas o mais importante é que a trumponomics, em prazos maiores, matará a força do crescimento americano das últimas décadas. A taxa de crescimento da produtividade, maior do que na Europa, deverá cair como consequência da desglobalização induzida por Trump. O ataque às universidades somente agravará a longo prazo o desempenho da produtividade americana.
Para a esquerda brasileira, parece-me que sobram duas lições. A primeira é que ninguém ganha quando o presidente da República ataca diretamente o presidente do Banco Central.
Em segundo lugar, vale lembrar todo o ruído e a campanha contra a globalização capitaneada pela esquerda nas últimas décadas. Tanto se pediu que apareceu um líder empenhado em realizar o desejo da esquerda brasileira. Não parece ser positivo para o Brasil ou para o mundo.
Link da publicação: https://www1.folha.uol.com.br/colunas/samuelpessoa/2025/08/trump-esta-vencendo.shtml
As opiniões aqui expressas não refletem necessariamente as do CDPP, tampouco as dos demais associados.