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Tarifaço e atividade econômica

Folha

Os cálculos sugerem que o tarifaço de Trump deverá reduzir nossas exportações em aproximadamente R$ 5 bilhões em 2025 e outros R$ 10 bilhões em 2026.

Em geral, nossas exportações têm um conteúdo de 16% de insumos importados. Isso deve gerar uma perda de 0,15% do PIB em 2025 e de uns 0,3% em 2026. Já supusemos que parte da queda das exportações seria absorvida pelo mercado doméstico. O choque representa uma redução da demanda por nossos produtos. É, portanto, desinflacionário.

O governo anunciou o Plano Brasil Soberano. Ele terá três pilares principais.

Primeiro, haverá recursos de R$ 30 bilhões do FGE (Fundo de Garantia às Exportações) para serem administrados pelo BNDES. O FGE, além de oferecer garantias, passará a emprestar diretamente recursos às empresas, dentro do limite de R$ 30 bilhões.

A taxa de juros será decidida pelo CMN (Conselho Monetário Nacional). Como se trata de uma operação de crédito de um fundo público, não há aumento do gasto primário, nem do déficit primário.

O segundo pilar é a capitalização de três fundos privados: R$ 1,5 bilhão no FGCE (Fundo Garantidor do Comércio Exterior); R$ 2 bilhões no FGI (Fundo Garantidor para Investimentos), gerido pelo BNDES; e R$ 1 bilhão no FGO (Fundo de Garantia de Operações), gerido pelo Banco do Brasil. Como os fundos são privados, a capitalização de R$ 4,5 bilhões impactará o gasto primário.

Espera-se, com esses fundos privados, que a garantia de crédito chegue mais facilmente às micro e pequenas empresas que desejam exportar. O gasto de R$ 4,5 bilhões será abatido da meta de superávit primário e do teto dos gastos.

O terceiro pilar do Plano Brasil Soberano será a extensão do Reintegra, antes restrito às pequenas empresas, às grandes e médias. Na prática, trata-se de um subsídio para as empresas que exportam. O fato gerador é a exportação e o benefício é uma alíquota sobre o valor exportado: elevação para as pequenas de 3% para 6% e alíquota de 3% para as médias e grandes.

O Reintegra estendido valerá até que o gasto total no âmbito da extensão seja de R$ 5 bilhões. O programa gera um crédito tributário que permite o abatimento de outros impostos federais. A perda de receita de R$ 5 bilhões será abatida da meta de superávit primário.

Esse tipo de programa, que na prática é um subsídio à exportação, poderia ser questionado na OMC. Como os EUA resolveram destruir o multilateralismo, não se esperam grandes reações dos demais países na OMC.

O impulso de demanda –R$ 4,5 bilhões de gasto primário, R$ 5 bilhões de perda de receita e R$ 30 bilhões de crédito– é da ordem de grandeza da queda de demanda promovida pelo tarifaço. Assim, do ponto de vista da atividade econômica para os próximos trimestres, a resultante do tarifaço com o Plano Brasil Soberano será neutra.

Ao se retirar da meta de superávit primário os R$ 9,5 bilhões de piora fiscal, que ocorrerá em função das ações do Plano Brasil Soberano, haverá perda de credibilidade do arcabouço fiscal.

Dado a lógica de focar as políticas públicas nas empresas –sempre me pareceu uma lógica pró-negócio em vez de pró-mercado– não me parece que o desenho é ruim. Em particular, melhorar as garantias para as exportações das pequenas empresas é positivo. Meu colega Rodrigo Zaidan fez ontem neste espaço a crítica à excessiva ênfase em políticas pró-negócio. Recomendo a leitura.

Link da publicação: https://www1.folha.uol.com.br/colunas/samuelpessoa/2025/08/tarifaco-e-a-atividade-economica.shtml

As opiniões aqui expressas não refletem necessariamente as do CDPP, tampouco as dos demais associados.

Sobre o autor

Samuel Pessôa