Folha
Gabriel Galípolo, presidente do BC (Banco Central) indicado por Lula e no cargo desde o início do ano, tem sido uma grata surpresa. Não são poucos os desafios de Galípolo.
Como já tratei mais de uma vez neste espaço, o terceiro mandato de Lula é caracterizado pela inversão do ciclo político da despesa pública. Lula resolveu iniciar o mandato com o pé no acelerador do gasto público.
A consequência é que temos um longo ciclo de aperto monetário e um aumento do endividamento público que, tudo sugere, será —entre dezembro de 2022 e dezembro de 2026— de 11 pontos percentuais do PIB (de 72% do PIB para 83%).
Nessa situação, a condução da política monetária é extremamente difícil. O banqueiro central precisa mostrar que estará disposto a perseguir a meta de inflação. Mas, além de falar grosso, precisa agir.
Galípolo tem falado grosso e tem agido. Na linguagem de mercado, tem sido um banqueiro central que se comporta como os falcões, hawkish, em vez de se comportar como uma bela pomba branca, isto é, dovish.
Tem evitado sinalizações na véspera das reuniões do Copom (Comitê de Política Monetária). Costuma iniciar eventos com afirmações como “não há qualquer mensagem nova a ser passada”. Os demais diretores têm adotado a mesma postura.
Tem havido também coerência entre os diversos canais de comunicação empregados pelo Banco Central: o comunicado, no final do dia após o término da reunião do Copom, como foi o caso na quarta-feira passada; a ata, sempre publicada uma semana após a reunião; o RPM (Relatório de Política Monetária), publicado trimestralmente; e em entrevistas coletivas.
Além da parcimônia e coerência na comunicação, o Banco Central tem enfatizado a sua função de reação, isto é, dizer como reagirá às diferentes contingências, sem se apegar a um conjunto de ações específicas. Dado o elevado grau de incerteza prevalecente para a condução da política monetária, é preferível uma condução que explicite as contingências, e sua função de reação a elas, do que traçar um caminho.
Em particular, o Copom não tem fugido do problema. Tem reconhecido com toda a franqueza o problema da falta de convergência das expectativas.
O resultado tem aparecido. A mediana das expectativas do Focus para 2026 recuou de forma consistente por oito semanas consecutivas, acumulando queda de 20 centésimos de percentagem (de 4,5% para 4,3%). Para 2027, após 26 semanas de estabilidade, houve redução nas últimas quatro semanas, totalizando 10 centésimos de percentagem (de 4,0% para 3,9%). As projeções para 2028 e 2029 também cederam, respectivamente, em 10 e 15 centésimos de percentagem.
Apesar do desemprego em níveis historicamente muito reduzidos e do desequilíbrio fiscal estrutural, a queda das expectativas de inflação tem surpreendido a todos. A meta de inflação relativamente baixa, 3%, e um BC que melhora a sua reputação explicam este fenômeno. É por esses dois motivos que as expectativas Focus para 2028 e 2029 são, respectivamente, de 3,7% e 3,5%, e não de 5%.
Evidentemente, teremos um encontro marcado com um ajuste fiscal no próximo governo. Somente a boa condução da política monetária não conseguirá impedir uma aceleração da inflação. O Banco Central tem sido uma ponte para que a sociedade negocie em 2026 suas diferenças e quem quer que seja eleito encaminhe o desequilíbrio fiscal estrutural a partir de 2027.
Link da publicação: https://www1.folha.uol.com.br/colunas/samuelpessoa/2025/09/recuperacao-da-reputacao-do-bc.shtml
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