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Os perigos de uma bolha

Há muita gente gastando muito para sustentar negócios que não se sabe se darão retorno

Estadão

Crescem as preocupações no mundo em torno da existência de uma bolha no preço das ações das empresas de inteligência artificial. Há semanas, investidores, analistas e a imprensa especializada falam no tema, que gera preocupações sobre o potencial de danos, proporcional ao gigantismo do setor.

A experiência mostra que, quando o assunto bolha surge no mercado, é momento de ter cuidado. Bolhas se formam quando há uma empolgação exagerada com um ativo, que causa aumento irreal no seu valor. É uma corrida insensata, que produz preços insustentáveis.

A mais traumática das bolhas na história recente foi a dos ativos subprime, cuja explosão levou à crise de 2008, talvez a mais destrutiva da história, cujos reflexos subsistem até hoje.

Já contei aqui que percebi o problema poucos meses antes, ao conversar em Nova York com uma motorista brasileira, que me relatou estar comprando casas financiadas, pois os juros estavam baixos e os bancos nada exigiam. Com o aluguel de uma, ela pagava as prestações de outra casa. Sabemos as consequências quando essa dinâmica insustentável se rompeu.

A inteligência artificial é a nova fronteira do conhecimento humano. De onde estamos — e com o que sabemos hoje —, não enxergamos seus limites e potencial para a economia. Isso explica os imensos investimentos de empresas de tecnologia em projetos de inteligência artificial. Explica também a empolgação dos investidores, que tornaram essas empresas tão valorizadas.

Todos querem desenvolver primeiro o modelo mais avançado, todos querem ter ações da empresa que chegar ao topo antes. Mas, na semana passada, o jornal Financial Times publicou que gestores ouvidos pelo Bank of America acham que essas empresas estão gastando demais no desenvolvimento de produtos. Empresas americanas emitiram mais de US$ 200 bilhões em títulos de dívida este ano para financiar projetos de IA.

Há muita gente gastando muito e se endividando para sustentar negócios que não se sabe quando darão retorno. Neste mês, o Nasdaq Composite, índice da Bolsa americana de empresas de tecnologia, caiu 6% até sexta-feira. É um sinal de medo dos investidores, que merece atenção.

No ano 2000 tivemos o estouro de uma bolha em torno de empresas de tecnologia. À época, falava-se na nova economia, num modelo no qual as regras do mercado como conhecíamos poderiam não se aplicar, dada à inovação trazida por essas empresas. Alguns acreditavam em crescimento sem limites. Não foi assim. A lição daquele episódio é que a inovação não é imune às regras da economia de mercado. É preciso cautela.

Link da publicação: https://www.estadao.com.br/economia/henrique-meirelles/inteligencia-artificial-que-licoes-do-passado-nos-ajudam-a-lidar-com-os-riscos-de-uma-nova-bolha/

As opiniões aqui expressas são do autor e não refletem necessariamente as do CDPP, tampouco as dos demais associados.

Sobre o autor

Henrique Meirelles