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Supersalários no serviço público

Folha

O Globo, a Folha O Estado de S. Paulo estamparam, no mesmo dia (30/11/25), editorais sobre os supersalários no setor público. Repercutiam o excelente estudo de Sergio Guedes-Reis, publicado por República.org e Movimento Pessoas à Frente.

Comparando o Brasil a dez outros países, o estudo mostra que somos um ponto fora da curva. São 40 mil servidores situados no 1% mais rico do país. Em segundo lugar, a léguas de distância, vem a Argentina, com apenas 880 servidores entre o 1% mais rico. Portugal tem 33, e a Alemanha, 16. As remunerações extrateto são altas para o padrão de renda brasileiro. Logo, não vale o argumento de que se fura o teto porque ele é baixo.

O custo é significativo: R$ 20 bilhões por ano.

O fenômeno é mais intenso nas carreiras jurídicas: magistratura, Ministério Público, procuradores e advogados do Poder Executivo.

O problema resulta de: a) autonomia para definir a própria remuneração, muitas vezes de forma infralegal; b) captura dos Conselhos Nacionais de Justiça e do Ministério Público por interesses corporativos; c) força política das prerrogativas dos cargos.

A confusão entre interesse privado e institucional é ilustrada pela avaliação do presidente do STF sobre o projeto de reforma administrativa que se propõe a limitar excessos salariais: “Ninguém pense que fará por cima do Judiciário uma reforma contra o Poder Judiciário brasileiro. Não permitiremos e estarei vigilante para que haja respeito à magistratura brasileira”.

As gratificações são inúmeras. As justificativas de algumas parecem zombar da inteligência dos contribuintes: férias de 60 dias que podem ser convertidas em espécie, auxílio-livro, auxílio-moradia, remuneração por acúmulo de funções, gratificações de produtividade pagas a aposentados.

Sobre muitos desses adicionais não incidem Imposto de Renda ou contribuição previdenciária.

Destaque para os honorários de sucumbência, pagos aos advogados públicos como um percentual de causas ganhas para o erário, sem descontar os valores das causas perdidas. Temos advogados públicos cada vez mais ricos, enquanto crescem os precatórios a pagar, decorrentes de causas perdidas.

O problema está se espalhando para outras áreas da administração pública. Foram aprovados no Senado projetos de lei alterando os planos de carreira dessa casa legislativa e do TCU, nos quais a cada dez dias trabalhados o beneficiário ganha um dia de folga. Se não quiser folgar, leva em dinheiro. O valor não será limitado pelo teto remuneratório. O Tribunal de Justiça do DF fez o mesmo, por decisão administrativa, sem propor lei.

Os penduricalhos salariais fazem subordinados ganharem mais do que chefes, desestimulando a assunção de responsabilidades e o esforço para ser promovido. Envenenam o ambiente de trabalho, ao criarem enormes diferenças salariais entre pessoas que trabalham lado a lado. Por exemplo, técnicos do Banco Central ganham muito menos que os advogados da autarquia. No Ministério da Fazenda, auditores do Tesouro recebem menos que os advogados da PGFN e que auditores da Receita Federal.

Estimulam perda patrimonial ao erário ao induzir transações tributárias rápidas e com altos descontos.

Deixam à míngua entidades essenciais, cujos servidores têm baixo poder de barganha, como IBGE, CVM, Inpi e agências reguladoras. Desmoralizam o TCU, que deveria ser o primeiro a coibir a prática, mas preferiu embarcar nas benesses.

Os supersalários são sintoma da deterioração do etosnacional, que normalizou a apropriação de recursos públicos por grupos de interesse.

Link da publicação: https://www1.folha.uol.com.br/colunas/marcos-mendes/2025/12/supersalarios-no-servico-publico.shtml

As opiniões aqui expressas não refletem necessariamente as do CDPP, tampouco as dos demais associados.

Sobre o autor

Marcos Mendes