A inflação foi uma doença crônica no País, o Plano Real acabou com isso, mas há sequelas; convivemos ainda com um motor da inflação, que é o descontrole fiscal
Estadão
Há anos, a pergunta acima é uma das que eu mais ouço quando faço palestras, dou entrevistas ou converso com pessoas interessadas em economia e finanças. Como na semana passada o Copom decidiu elevar a taxa Selic de 14,25% para 14,75% ao ano, sei que a dúvida persistirá e que serei perguntado novamente.
Assim, tentarei explicar. Em primeiro lugar, os juros são altos devido ao fato de que a economia brasileira ainda é indexada. As despesas do governo são reajustadas de acordo com a inflação do ano anterior. O mesmo vale para preços sob supervisão de agências reguladoras, como energia e água. Isso faz com que preços livres da economia, mesmo no mercado privado, também sofram influência. A cultura da indexação não foi superada.
Além disso existe o histórico inflacionário do Brasil. A inflação foi uma doença crônica nas décadas de 1970, 80 e 90. Fomos um dos poucos países da história a conviver com a hiperinflação, que chegou a 82% ao mês em 1990. O plano Real, de 1994, acabou com isso, mas há sequelas.
Este passado faz com que a expectativa de inflação seja elevada no Brasil, o que afeta os agentes econômicos. O sistema de metas foi estabelecido em 1999 e a meta atual é de 3% ao ano, baixa perto do que já vivemos, mas acima das praticadas em economias mais desenvolvidas, na casa dos 2%. Um ponto porcentual parece pouco, mas neste caso é uma diferença significativa.
Convivemos ainda com um motor da inflação, que é o descontrole fiscal. Há décadas, governos brasileiros gastam mais do que arrecadam. Faz parte da cultura política brasileira o gasto público além da conta. Entre 1991 e 2015, durante cinco governos, o gasto público sempre cresceu acima da inflação: saltou de 10,8% do PIB em 1991 para 19,5% em 2015. Levamos isso ao limite com a visão de que o “gasto público é vida” que prevaleceu durante alguns anos. Isto só foi interrompido em 2016, quando eu era ministro da Fazenda e implantamos o teto de gastos.
O teto estabeleceu um limitador no crescimento das despesas públicas, que tirou o Brasil da pior crise da história recente, entre 2014-2016.
Por fim, há momentos em que a taxa de juros necessária é alta. A Selic atual reflete a situação da economia, em que as expectativas de inflação para este ano e o próximo estão acima da meta e existe o risco de desancoragem por um período mais longo.
O governo não só não reduziu o ritmo de gastos, como mantém a injeção de recursos públicos na economia. Isso sem falar no cenário externo, um dos mais complexos da história recente. A taxa de juros tem motivos concretos para estar alta neste momento.
Link da publicação: https://www.estadao.com.br/economia/henrique-meirelles/por-que-juros-sao-altos-brasil/
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