Folha de São Paulo
O país tem experimentado nas últimas semanas uma sensação de conforto –que infelizmente pode ser enganosa. É verdade que existem elementos concretos para gerar certo alívio no meio empresarial e na sociedade em geral. São indicadores que se revelam consistentes e com capacidade de se reproduzirem ao longo do tempo.
Tal percepção começou a se formar com a constatação de que a retomada da economia se espalha para além do agronegócio e do setor mineral, chegando à indústria, ao varejo e, em menor escala, aos serviços.
O otimismo dos mercados financeiros daí decorrente atingiu seu ápice com a estimativa do BC de alta de 0,55% da economia em julho, superando as expectativas de consultorias e bancos. A ascensão econômica gera a perspectiva de que o emprego engate de vez a trajetória de recuperação, conforme demonstram os dados oficiais recentes.
Dois fatores reforçam a orientação positiva que se tem hoje da economia. Um deles é a trajetória da inflação, que registrou aumento anualizado de apenas 2,5%, sinalizando juros em níveis baixos para os padrões brasileiros em um futuro próximo. O outro fator encontra-se na balança comercial, cujos excelentes resultados reforçam as já robustas reservas cambiais do país, o que representa um seguro extra para eventuais crises externas.
Não podemos, de forma alguma, ignorar esses bons ventos que sopram sobre a economia. Mas não podemos também deixar que o otimismo exacerbado mascare uma realidade preocupante: as reformas não estão avançando com o senso de urgência necessário.
Como se sabe, a barreira fundamental a ser superada na economia brasileira é o desarranjo das contas públicas, cuja gravidade não pode ser menosprezada. Ela não será vencida sem aquela que se trata da reforma das reformas: a da Previdência.
Mudanças nas regras previdenciárias, cada vez mais ameaçadas pela renitente crise política, precisam ocorrer com máxima celeridade, sob o risco de que esse mesmo ajuste no futuro traga custos maiores e benefícios menores para a sociedade.
Para conquistar uma economia arejada e livre de antigas práticas viciadas, será imprescindível remover os privilégios das corporações e promover uma série de outras reformas, além de estabelecer novas políticas públicas. É hora ainda de rever os subsídios de toda a ordem abrigados sob a rubrica “gastos tributários” do Orçamento, que consomem mais de 4% do PIB.
Reside aí a condição para que a situação fiscal seja equacionada por meio de corte de despesas, e não de carga tributária maior. Só assim a atividade econômica continuará ganhando fluidez e se tornará receptiva a inovação e empreendedorismo.
Não é tarefa simples, pois exige iniciativas com elevado grau de complexidade, que vão da abertura ao exterior à maior conexão do país com a economia global; da simplificação tributária à redução da burocracia; das reformas microeconômicas à revisão das políticas industriais questionadas pela OMC.
No horizonte, surge, porém, um sinal de alerta. É possível que o atual governo, imerso num clima de instabilidade permanente, não tenha condições de conduzir as reformas antes do fim do mandato. Se assim for, caberá ao próximo assumir essa dura tarefa e recuperar o tempo perdido. Por tabela, crescerá na mesma proporção nossa responsabilidade na escolha de um nome para liderar o país nas eleições de 2018.
Após breve pausa para descanso, volto à coluna em 20 de outubro.
As opiniões aqui expressas são do autor e não refletem necessariamente as do CDPP, tampouco as dos demais associados.