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Afinal, estamos desacelerando?

Quando olhamos o atual ambiente vemos que a política monetária terá que se manter dura por bastante tempo

InfoMoney

No último Relatório de Política Monetária, o Banco Central discutiu a incerteza sobre a intensidade da desaceleração do PIB no início deste ano. De acordo com as projeções daquele período, o PIB seria fortemente influenciado pela conjuntura agropecuária – o que de fato ocorreu. Porém, excluindo esse setor, também era esperada uma aceleração do crescimento na margem, ainda que mais modesta.

A questão que se colocava, portanto, era com relação a essa magnitude, dado o ciclo de aperto monetário então em curso. Segundo a instituição, parte desse avanço do PIB ex-agropecuária poderia ser atribuída ao método de ajuste sazonal – direto, quando aplicado à série agregada, ou indireto, quando aplicado aos componentes separadamente.

Após a divulgação do resultado do primeiro trimestre de 2025, que avançou 1,4% t/t na métrica dessazonalizada, realmente houve uma discrepância de estimações entre os economistas para o crescimento excluindo o setor agrícola. A alta estaria no intervalo bastante significativo de 0,2% a 0,8%. Qual a verdadeira mensagem então?

Para além desse indicador, há outros que podemos explorar. Começando com os dados mais recentes do mercado de trabalho, destacam-se as surpresas significativas com relação às projeções. O Caged mostrou que o emprego formal segue muito resiliente, com um saldo de quase 90 mil vagas acima do esperado em abril. Por sua vez, a taxa de desemprego da PNAD Contínua atingiu 6,6%, enquanto o consenso das expectativas indicava 6,9% para o mês.

Além disso, esses indicadores mostraram que houve um novo avanço dos salários de admissão, enquanto os rendimentos reais avançam mais de 3% na comparação interanual, mantendo patamares elevados. Ou seja, certamente ainda não estamos em um ponto de inflexão nesse segmento. Inclusive, as sondagens do consumo, do comércio e de serviços avançaram na ponta em maio, em situação atual.

Se isto não bastasse, o governo persiste com a adoção de medidas parafiscais para tentar ampliar a demanda, reduzindo a desaceleração econômica, que é tão importante para que a inflação possa voltar as suas metas do Banco Central.

Mais recentemente, pesquisas de opinião mostraram alta significativa da desaprovação do presidente, por conta disso o governo tem intensificado o anúncio de medidas expansionistas para tentar reverter este quadro.

Já as estatísticas de crédito trouxeram concessões mais altas em abril, mas junto a um avanço da taxa de inadimplência, que atingiu o patamar de 3,5%, influenciada especialmente pelo crédito livre (tanto por pessoas físicas, quanto por pessoas jurídicas). Além disso, o endividamento das famílias apresentou nova aceleração na margem. Essas métricas, que têm defasagem de um mês em relação às demais, são usadas pelo BC para medir o volume de crédito no futuro – indicando, portanto, alguma possível desaceleração.

Finalmente, temos a dinâmica da inflação ao consumidor. Os últimos dados deram algum alívio, com surpresas baixistas não só no número cheio, mas também em termos de composição. Em maio, serviços subjacentes e bens industriais contribuíram para uma perspectiva mais favorável, mesmo com níveis ainda pressionados.

Em comparação ao último Copom, a fotografia é melhor: as principais métricas do IPCA arrefeceram e houve queda nas expectativas de inflação. Ao mesmo tempo, a taxa de câmbio apreciou. Isso pode ser uma sinalização de que os preços de fato possam estar se acomodando.

Tudo isso mostra que há sim sinais de desaceleração da atividade, mas esse processo tende a levar um bom tempo, principalmente pela atitude do governo de ir na direção contrária ampliando a demanda através de vários novos programas.

A taxa juros, Selic, já é bastante restritiva, os juros reais “chamados de ex-ante“, ou seja, os juros de 12 meses a frente acima da inflação projetada, também para os próximos 12 meses, está a quase 10%aa, bastante acima do juro considerado neutro.

Isso reforça a possibilidade de termos terminado o processo de alta.

No final, quando olhamos o atual ambiente vemos que a política monetária terá que se manter dura por bastante tempo, tendo que se contrapor a políticas que tem atrapalhado muito seu trabalho, quando não temos harmonia de políticas a sociedade acaba pagando um alto preço.

Este artigo teve a co-autoria de Thaís Rodrigues, economista da BuysideBrasil.  

As opiniões aqui expressas são do autor e não refletem necessariamente as do CDPP, tampouco as dos demais associados.

Sobre o autor

Luiz Fernando Figueiredo