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Na última reunião, o Banco Central surpreendeu o mercado ao elevar a taxa Selic em 0,25 p.p., para 15% ao ano. O consenso das expectativas indicava manutenção da taxa, mas ainda assim o Comitê optou por seguir o caminho mais técnico – e talvez mais difícil – em um momento em que diversos fatores ofereciam argumentos suficientes para interrupção do ciclo de aperto monetário.
Do lado dos argumentos para pausa, tínhamos a própria mediana do mercado em 14,75% ao ano, segundo a pesquisa Focus – dando margem para não agir sem que parecesse leniente. O câmbio também colaborava: desde a última reunião, o real havia se apreciado, passando de R$ 5,70 para R$ 5,60 segundo a métrica do BC. Já no cenário internacional, a incerteza aumentou com o acirramento das tensões entre Irã e Israel, em um contexto global já fragilizado pelas políticas fiscais e comerciais dos Estados Unidos.
Internamente, os dados de crédito mostraram uma aceleração pontual em abril, mas acompanhada de deterioração da taxa de inadimplência e do endividamento das famílias – o que aponta para uma tendência de desaceleração do crédito adiante. Além disso, a autoridade monetária sabia que o resultado do PIB do primeiro trimestre viria inflado pelo desempenho excepcional da agropecuária. Já no último Relatório de Política Monetária (antigo Relatório Trimestral de Inflação), o BC destacou esse ponto em um boxe, alertando para ruídos na leitura do dado.
Por sua vez, a inflação corrente mostrou melhora na margem, com o IPCA-15 e o IPCA fechado de maio surpreendendo para baixo e com composição mais benigna. Os próprios discursos recentes dos membros do Copom indicavam preferência por manter a taxa elevada por mais tempo, em detrimento de novas altas, já que os efeitos das altas anteriores ainda estariam em curso e precisariam de tempo até que se refletissem nos indicadores, contendo a inflação.
Ainda assim, o BC elevou os juros. A decisão foi impopular, mas técnica. Contribuíram para isso as expectativas de inflação ainda desancoradas em relação à meta e a inflação ainda pressionada, sobretudo nos serviços – setor sensível à atividade econômica.
Nesse sentido, o mercado de trabalho seguiu resiliente. Os últimos dados mostraram rendimentos reais ainda fortes e uma taxa de desocupação historicamente baixa, reforçando o risco de pressões salariais. Isso, junto ao carrego estatístico do resultado do PIB do primeiro trimestre, reforçou expectativas de crescimento acima de 2% para 2025 – dificultando o arrefecimento da inflação.
O que tem realmente mais dificultado o trabalho do BC tem sido o governo, que tem adotado medidas fiscais e parafiscais de natureza expansionista, como aumento de transferências, que funcionam de forma contracíclica, estimulando o consumo (em um momento de juros restritivos e inflação resistente). Essas escolhas, motivadas principalmente por pesquisas recentes de queda de popularidade do Executivo, também tendem a elevar a percepção de risco e inibir investimentos no país.
Por fim, se o cenário internacional traz incertezas, também é verdade que os conflitos geopolíticos recentes impulsionaram os preços do petróleo, o que pode ser um vetor adicional de pressão na inflação.
Diante desses pontos, o Banco Central sinalizou que não hesitaria em ajustar novamente os juros se necessário, mas indicou que, por ora, vai observar os efeitos do aperto já promovido. Essa combinação de prudência e vigilância reafirma a importância de se ter uma autoridade monetária autônoma, comprometida com o interesse público de longo prazo.
O Copom mostrou, nesta reunião, que é um órgão de Estado, e não de governo. Ao adotar uma decisão contrária ao que o Planalto gostaria, o BC reforçou a credibilidade de sua atuação e a importância de sua autonomia. Em tempos de incerteza, serenidade e compromisso com a estabilidade são virtudes valiosas – e cada vez mais raras.
É por isso que este órgão de Estado deveria também contar com uma autonomia administrativa e financeira, embora muito incomum, o governo pode sim asfixiar a capacidade do BC de fazer o seu trabalho, dificultando através do aperto financeiro, que ele tenha a estrutura mínima apropriada para conduzir tanto a política monetária quanto a fiscalização e regulação do sistema financeiro.
*Este artigo teve a co-autoria da Thaís Rodrigues, economista da BuysideBrasil.
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