Abertura comercial tem o potencial de colocar a economia brasileira numa trajetória de crescimento rápido
Globo
Autoridades brasileiras na busca por soluções para a crise com os Estados Unidos devem lembrar que podem existir vantagens para o país se Donald Trump der início a negociações com ênfase em questões comerciais. Confirmado esse cenário, o fato de os americanos serem superavitários nas trocas com o Brasil não deve ser usado para encerrar a questão. O governo Lula precisa aproveitar a oportunidade para promover a abertura da economia brasileira, uma das mais fechadas do mundo. O ganho imediato será encerrar a celeuma com Trump. Mas é essencial lembrar que ceder, neste caso, não significa perder. Pelo contrário. Ao facilitar a entrada de produtos importados, o Brasil poderá destravar o potencial de crescimento.
Os brasileiros conhecem como poucos as consequências nefastas do protecionismo. Há décadas, a economia cresce num ritmo medíocre. Na corrida global, o país não para de ser ultrapassado. Como revelou o jornal Valor Econômico, o Brasil ocupava em 1980 o 48º lugar no ranking do Produto Interno Bruto (PIB) per capita calculado levando em conta o poder de compra. No ano passado, ficou na 85ª posição. Pelas projeções do Fundo Monetário Internacional (FMI), chegará à 89ª até 2030. A cada ano que passa, está mais próximo da metade mais pobre do planeta.
Uma das explicações para a lentidão na produção de riqueza é a baixa competição de importados no mercado doméstico. Sem muita concorrência, as empresas locais têm muito incentivo para vender produtos caros e pouco estímulo para inovar. Num ambiente complacente, a busca pela produtividade acaba desincentivada. Por isso ela cresce a passos lentos, muito abaixo das principais economias. Em 1980, eram necessários dois brasileiros para produzir o mesmo que um americano. Hoje é preciso juntar um grupo de quatro. A situação só piora.
“Existem evidências abundantes de que uma maior integração comercial teria efeitos positivos sobre a produtividade e contribuiria para a redução dos preços ao consumidor”, diz Fernando Veloso, diretor de pesquisa do Instituto Mobilidade e Desenvolvimento Social (IMDS) e um dos autores do livro recém-lançado “Integração comercial internacional do Brasil”.
Embora o saldo para a sociedade seja positivo, os que saem perdendo com a abertura precisam de algum apoio para buscar atividades alternativas. Mas tal desafio não deve ser usado como desculpa para manter o Brasil preso numa situação de baixo crescimento perpétuo. Por certo, o desenvolvimento econômico depende de outras dimensões, entre elas a infraestrutura. A consultoria Inter.B estima que para o Brasil modernizar esse setor de forma adequada seria necessário mais que dobrar os investimentos por 20 anos. Avanços em capital humano são igualmente essenciais. Todos esses objetivos devem ser perseguidos ao mesmo tempo.
Se Trump abandonar demandas absurdas, como a ingerência no Judiciário, e concentrar a negociação no comércio poderá estar fazendo um favor ao Brasil. Tudo dependerá dos detalhes finais de um futuro acordo. É verdade que Trump acredita no protecionismo. Mas isso é um problema dos americanos.
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