Entrevistas

‘Anistia para condenados pelo STF não traria paz, mas risco à democracia’, diz jurista

CBN

O julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF) que condenou o ex-presidente Jair Bolsonaro e militares envolvidos nos atos golpistas de 8 de janeiro representa um marco para a democracia brasileira. A avaliação é do professor da FGV Direito, São Paulo, Carlos Ari Sundfeld, em entrevista ao Estúdio CBN.

Segundo ele, a principal lição é clara: a Constituição e a lei valem para todos.

“Isso não é pouco, porque na história, mesmo de grandes países, o respeito às normas parece ter graus variados. No Brasil, acostumamo-nos a uma certa indiferença em relação aos grandes valores jurídicos públicos. O julgamento reafirma que ninguém está acima da lei”, disse.

Sundfeld lembrou que Bolsonaro, ao longo de sua trajetória política, manteve um discurso de elogio à ditadura e ao desrespeito aos direitos humanos. Para o jurista, a escalada de ataques às instituições teve como ápice o 7 de setembro de 2021, quando o então presidente afrontou o Supremo em discurso na Avenida Paulista.

O professor destacou ainda o caráter inédito da decisão do STF. Pela primeira vez, a Corte tratou diretamente do alcance do artigo 142 da Constituição, que define o papel das Forças Armadas.

“O Supremo afirmou que o artigo não dá a militar algum o direito de rever decisões judiciais. Reafirmou a ideia de que a Justiça tem a última palavra”, explicou.

Outro ponto considerado inovador foi o julgamento de militares de alta patente em crimes relacionados a tentativa de golpe, algo sem precedentes desde a redemocratização. Para Sundfeld, a decisão mostrou que também as Forças Armadas estão sujeitas à Constituição.

“Foi importante que o Supremo tenha examinado isso com serenidade. A resistência dos comandantes militares à adesão ao golpe foi destacada e reconhecida como um episódio marcante na história recente”, disse.

Ao analisar a proposta de anistia em debate no Congresso, o professor fez um contraponto com o passado. Na transição para a democracia, a anistia serviu como instrumento de reconciliação e restauração da ordem democrática. Hoje, segundo ele, o contexto é oposto.

“A ordem está mantida. O que se tenta agora é perdoar pessoas que ainda defendem golpes como futuro desejável para o país. É preciso dizer claramente do que se trata”, afirmou.

Para Sundfeld, a eventual aprovação de uma nova anistia não encerraria a questão. Ele prevê que a medida seria vetada pelo presidente da República e acabaria sendo questionada judicialmente.

Link da publicação: https://cbn.globo.com/programas/estudio-cbn/entrevista/2025/09/12/anistia-para-condenados-pelo-stf-nao-traria-paz-mas-risco-a-democracia-diz-jurista.ghtml

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