Artigos

PEC dos precatórios aprofunda o desequilíbrio fiscal

Folha

A promulgação da PEC dos precatórios, agora emenda constitucional 136/25 (EC 136), aprofunda o desequilíbrio fiscal nos três níveis de governo.

Os estados e municípios deixarão de pagar, por ano, R$ 20 bilhões aos credores de precatórios e poderão usar esse dinheiro para outras despesas. Desrespeita-se o direito legal dos credores e abre-se mais espaço para gastos.

Esta é nada menos que a décima emenda constitucional que trata de precatórios. Mas é a primeira que coloca no texto principal da Constituição um limite permanente para o pagamento desses débitos.

Antes, faziam-se esquemas temporários de parcelamento de precatórios em atraso, inseridos nas disposições transitórias da Constituição. Agora, o limite se aplica não só aos que estão em atraso mas aos recém-emitidos.

Como foram fixados limites muito baixos, haverá crescente saldo de precatórios não pagos. Estimo que, em 2030, o valor pendente terá crescido, em termos reais, 52%, pulando dos atuais R$ 243 bilhões para R$ 370 bilhões —a preços de 2024.

A EC 136 também refinancia a dívida dos municípios com o INSS, a juros e prazos camaradas, com um custo de até R$ 84 bilhões para a União.

Esta emenda é mais um passo no desmonte das regras de contenção fiscal de estados e municípios, construídas ao final dos anos 1990 e que, por duas décadas, conseguiram induzir os governos subnacionais a equilibrar as contas, garantindo o sucesso do Plano Real

Agora há cada vez mais espaço para gastar, empurrando a conta para os credores privados e para o Governo Federal. Estamos voltando à situação do final dos anos 1980. O problema deixou de ser apenas de desequilíbrio das contas federais.

A EC 136 também afrouxou exigências para a União. Retirou a despesa com precatórios federais do teto de gastos, ampliou esse teto em R$ 13,4 bilhões e estipulou que, na apuração do resultado primário de 2027, serão considerados apenas 10% da despesa com precatórios, com acréscimos de 10 pontos percentuais a cada ano seguinte.

“Cumpre-se o arcabouço fiscal” não por esforço de ajuste, mas tirando despesa da conta, desmoralizando a regra. Manobras têm sido a regra, como mostro no estudo “Como driblar regras fiscais, e suas consequências sobre a dívida pública“, disponível no site do Insper.

Mesmo com a ajuda da EC 136, o alívio para o governo só dura até 2028, quando a meta de resultado primário voltará a ser de difícil cumprimento.

A despesa primária vai ultrapassar 19% do PIB em 2025, ante 17,9% em 2022, apesar de o PIB ter crescido acima do seu potencial por quatro anos seguidos e de despesas significativas terem sido excluídas das estatísticas.

Estamos no auge cíclico da economia, que impulsiona a receita pública. As rendas de petróleo são 120% maiores que as de dez anos atrás. Mesmo assim não conseguimos sair do déficit primário.

Com a queda do ritmo de crescimento, a partir deste ano, os indicadores se agravarão.

Isso já está captado pelas expectativas de mercado. Em agosto de 2022, a mediana das expectativas para a dívida bruta para o final de 2031, apurada pela pesquisa Focus do Banco Central, era de 87,5% do PIB. Em agosto de 2025, pulou para 93,5%. Essa é a prova do pudim da falta de lastro fiscal.

A aprovação da PEC da Blindagem, na busca por proteger parlamentares investigados por desvios de emendas parlamentares, dará mandatos eletivos ao crime organizado nos três níveis de governo.

Caminhamos para um narcoestado.

Dívida e déficit público, problemas graves, serão fichinha frente ao que está por vir.

Link da publicação: https://www1.folha.uol.com.br/colunas/marcos-mendes/2025/09/pec-dos-precatorios-aprofunda-o-desequilibrio-fiscal.shtml

As opiniões aqui expressas não refletem necessariamente as do CDPP, tampouco as dos demais associados.

Sobre o autor

Marcos Mendes