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O financiamento da educação

Valor Econômico


Apesar dos avanços educacionais recentes no Brasil, muitos desafios persistem. Nosso principal problema educacional é o baixo aprendizado dos nossos jovens, especialmente no ensino médio. Será que devemos alterar o nosso sistema de financiamento da educação para melhorar a qualidade no ensino médio brasileiro? Será que teríamos que desvincular os gastos da educação das receitas nos Estados e municípios?

O sistema educacional brasileiro é descentralizado, contando com redes municipais e estaduais, sendo que em muitas cidades há tanto escolas estaduais como municipais atendendo alunos da mesma série. Como financiar um sistema tão descentralizado sem deixar que haja grande desigualdade nos recursos educacionais em cada município?

A solução encontrada pela sociedade brasileira foi vincular uma parcela das receitas dos impostos estaduais e municipais aos gastos educacionais e criar um sistema de fundos estaduais, o Fundeb. A vinculação, assim como a descentralização da gestão, tem uma longa história no Brasil, tendo sido introduzida pela primeira vez na Constituição de 1934. De lá para cá, houve muitas mudanças, com a Constituição de 1967 revogando as vinculações e a de 1988 restaurando-as, por exemplo, dependendo do regime político em vigor.

A situação atual foi estabelecida pela Constituição de 1988 que diz que todos os Estados e municípios devem gastar 25% das suas receitas com a educação. Uma parcela desses recursos (20% das receitas) é direcionada para os fundos estaduais (que compõem o Fundeb) e depois são redistribuídos para as redes de acordo com o seu número de alunos no ensino básico.

Isso faz com que o gasto do Fundeb por aluno seja o mesmo para todos os alunos dentro de cada Estado. Municípios ricos com poucos alunos transferem recursos para municípios pobres com muitos alunos dentro do mesmo Estado. Além disso, o sistema faz com que as redes tenham que disputar alunos entre si para receber mais recursos. Várias pesquisas acadêmicas mostram que isso provocou um aumento das matrículas e da persistência dos alunos na escola.

Mas o Fundeb só existe porque existe a vinculação de recursos. Se cada município decidisse por conta própria quanto iria gastar com educação, os municípios ricos com poucos alunos iriam investir menos para diminuir as transferências de seus recursos para os municípios mais pobres. Ou seja, se as vinculações acabassem, o Fundeb também acabaria e os gastos com educação dependeriam das decisões e dos recursos disponíveis em cada município. Qual o problema disso?

Em primeiro lugar, isso causaria uma enorme diferença entre os recursos disponíveis para educação em cada município. Os municípios mais pobres gastariam somente R$ 400 por aluno/ano se continuassem a usar 25% das receitas com educação, enquanto os mais ricos gastariam mais de R$ 50 mil.

Além disso, as eleições não servem como mecanismo de controle, pois sabemos que os eleitores não elegem seus prefeitos somente com base nos resultados educacionais. As elites locais historicamente sempre foram capazes de capturar a democracia, especialmente nos municípios menores, mais afastados dos centros de decisão e com mais pobreza. Assim, as vinculações devem ser mantidas.

Em 2017, a arrecadação total do Fundeb foi de R$ 143 bilhões, sendo que R$ 130 bi foram arrecadados pelos Estados e municípios. O governo federal sempre complementa esses recursos com 10% do total arrecadado (R$ 13 bi em 2017). Os recursos do governo federal são direcionados para os fundos estaduais em ordem decrescente de pobreza, de forma que todos os municípios do país atinjam o gasto mínimo por aluno estabelecido pelo governo federal.

Nesse contexto, o que podemos fazer para melhorar a educação no Brasil? Dado que os gastos com educação aumentaram muito nos últimos anos, agora é hora de melhorar a gestão desses recursos. Como o número de alunos está diminuindo fortemente e as receitas do Fundeb estão se recuperando, será possível aumentar o gasto por aluno mantendo os gastos como proporção do PIB.

Mas é possível distribuir melhor os recursos existentes. As regras atuais do Fundeb têm validade até 2020. Portanto, em breve haverá uma oportunidade de alterarmos o sistema de financiamento da educação no país, tornando-o mais eficiente e equitativo. Uma proposta nesse sentido é que os recursos da complementação da União devem ir diretamente para os entes federativos com menos recursos, ao invés de passar pelos fundos estaduais primeiro. Ao fazermos essa alteração, o menor gasto por aluno do país passaria de R$ 2.900 aluno/ano para R$ 3.900 aluno/ano em valores atuais.

No caso da gestão, é necessário copiar os exemplos bem-sucedidos de redes de ensino que conseguiram melhorar o aprendizado dos seus alunos sem grande aumento de gastos. O governo federal deverá liderar uma reforma completa na gestão educacional no país, usando 10% da sua complementação ao Fundeb (R$ 1.3 bi) para incentivar os Estados e municípios a adotarem práticas que melhoram a qualidade da educação, segundo as melhores evidências disponíveis.

Esses recursos seriam transferidos aos entes federativos de acordo com a adoção das seguintes práticas: porcentagem de escolas com pelo menos 4 horas de aula efetivamente ministradas por dia; porcentagem de crianças em creches ou em programas de visitação domiciliar para melhorar o desenvolvimento infantil; permissão para funcionamento de escolas charter; adesão aos padrões curriculares mínimos; avaliações de aprendizado de todos os alunos da rede pelo menos uma vez por ano; uso do estágio probatório para avaliação da efetividade dos professores e intervenção nas piores escolas de cada rede para melhorar o aprendizado dos seus alunos.

As opiniões aqui expressas são do autor e não refletem necessariamente as do CDPP, tampouco as dos demais associados.

Sobre o autor

Naercio Menezes Filho