Valor Econômico
O Banco Central tem caracterizado o ambiente internacional com o qual nos defrontamos como incerto, mas cujos efeitos sobre a economia brasileira têm sido mitigados. De fato podemos dizer que ainda temos um “interregno benigno” no cenário externo, que combina retomada da atividade com inflação e, até o momento, taxas de juros baixas. Há sinais que o interregno estaria se estendendo, embora, como sempre, existam também riscos no cenário.
A economia americana, após mais um início de ano relativamente fraco (padrão de comportamento que sugere a existência de alguma dificuldade no ajuste sazonal dos dados para o período de inverno) deve mostrar crescimento mais forte à frente, sustentado por um mercado de trabalho aquecido e por indicadores de confiança em território positivo. As condições financeiras, influenciadas pelo comportamento de preços de ativos, como das ações, também seguem favorecendo uma atividade econômica mais forte. Com esse cenário, as autoridades monetárias devem se sentir confortáveis em seguir elevando a taxa básica de juros gradualmente – os economistas do Itaú esperam altas de 0,25% em junho e setembro.
Mais para o final do ano, no quarto trimestre, o Fed deve finalmente dar início ao processo de encolhimento de seu balanço. Acreditamos que o Banco Central americano será extremamente cauteloso para evitar que o encolhimento do balanço gere tensões nos mercados, mas, como toda mudança de postura (vide o episódio do “taper tantrum”), há risco de sobrereação, ainda que momentânea. O maior risco doméstico, no momento, parece estar associado às dificuldades políticas da atual administração.
Já a área do euro tem sido fonte de surpresas favoráveis em atividade econômica, liderada, como de hábito, pela economia alemã. Indicadores de alta frequência sugerem que também na Europa a atividade tende a se fortalecer no segundo trimestre, com desempenho manufatureiro robusto e políticas de demanda acomodativas. O risco político mais iminente, associado à eleição presidencial francesa, foi superado – com um resultado eleitoral que parece sugerir que o euro-populismo já teria atingido seu auge.
Mas é possível argumentar, por outro lado, que a verdadeira prova da superação da tentação populista será a eleição geral italiana, que deve ocorrer até maio de 2018, mas que pode ser antecipada. A área de euro como um todo está crescendo em linha com o que deve ser seu potencial, mas a grande heterogeneidade de desempenho entre a Alemanha, de um lado, Itália e economias periféricas, de outro, sugere que as tensões internas devem continuar.
As autoridades chinesas vêm apertando as condições financeiras e a regulação, com vistas a evitar bolhas de ativos e promover o pouso suave da atividade. Note-se que esse aperto na postura de política atua sobre uma economia que teve um primeiro trimestre bastante robusto, mas que começou a mostrar sinais de desaceleração em abril. Acreditamos que a economia chinesa apresenta menos desequilíbrios do que há alguns anos, quando o temor quanto a uma possível crise gerava estresse recorrente nos mercados. Em particular, o importante setor imobiliário parece apresentar menor desequilíbrio entre oferta e demanda, e as pressões sobre a moeda parecem ter arrefecido. Ainda assim, pouso suave é algo que os gestores de política econômica mundo afora sempre tencionam conseguir, com êxito limitado. Assim, o caso chinês segue demandando monitoramento permanente.
As economias latino-americanas têm, em linhas gerais, mostrado um divórcio entre condições financeiras e atividade econômica. A economia cujos ativos tiveram pior desempenho em 2016, a do México, tem tido comportamento mais robusto do que a dos países ao sul, cujos ativos parecem ter embutido ritmo de retomada mais forte do que o que tem sido observado. No México, e no resto da região, estamos entrando em um período com calendário político-eleitoral muito importante: eleições no Estado do México em junho (que podem servir como prévia das presidenciais de 2018), eleições para o congresso argentino em outubro e para a presidência do Chile em novembro. Tal calendário pode adicionar volatilidade aos preços de ativos, como recorrentemente ocorre na região.
Nesse ambiente global, o crescimento deve se manter na faixa de 3,5%, acima do observado em média nos últimos anos, ainda que abaixo do que se verificou no período que antecedeu a crise de 2008-09 (mas, espera-se, com menos desequilíbrios). Assim sendo, a recente queda nos preços de matérias primas, como o minério de ferro, deve refletir mais a correção de excessos anteriores, do que o início de um processo mais sustentado – na medida em que a atividade manufatureira global siga em um ritmo relativamente robusto, as quedas nos preços de commodities devem ser pontuais, e não generalizadas e sustentadas.
Saindo da esfera estritamente econômica, os riscos geopolíticos seguem relevantes, em especial na península coreana, e os riscos de ataques cibernéticos também não devem ser subestimados.
A economia brasileira provavelmente saiu da recessão no primeiro trimestre desse ano – ainda que os dados mais recentes sugiram bastante cautela quanto ao ritmo futuro da recuperação. Com as informações até aqui disponíveis, parece que a economia mundial vai ajudar, e não atrapalhar, nossa recuperação. Por hora, parece que o interregno benigno apresentado pelo presidente do Banco Central no ano passado vai se estendendo.
As opiniões aqui expressas são as do autor e não refletem necessariamente as do CDPP, tampouco as dos demais associados.