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Brasil e México

Valor Econômico


O Brasil encontra-se num momento crítico de sua história. Os escândalos de corrupção se sucedem, a produtividade está estagnada desde a década de 80 e cerca de 60 mil pessoas são assassinadas todos os anos, especialmente os jovens negros. Nesses momentos cruciais é importante sair um pouco do debate conjuntural e pensar como conseguimos chegar a esse ponto. Será possível sair dessa situação?

Em primeiro lugar, é preciso saber se o Brasil é o único país que está passando por uma crise estrutural de crescimento ou se há outros que também padecem desse problema. Na verdade, vários países da América Latina passam por uma situação muito parecida com a nossa. A figura ao lado compara a evolução da produtividade no México e no Brasil nos últimos 50 anos. Podemos notar que, apesar de uma grande diferença de nível, em ambos os países a produtividade cresceu muito entre 1960 e 1980, estagnando (ou declinando) a partir de então.

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Brasil e México têm histórias muito diferentes. Os partidos políticos são completamente diferentes, assim como as decisões de política econômica ao longo do tempo. O México não teve uma Constituição cidadã e implementou várias reformas recentemente. Assim, o que poderia haver em comum nesses países a ponto de provocar trajetórias econômicas tão parecidas? Será mera coincidência?

O aumento de produtividade entre 1960 e 1980 pode ser explicado pelo processo de mudança estrutural que ocorreu em vários países do mundo (e está ocorrendo na China atualmente). Nesse processo as famílias deixam a agricultura familiar no campo para trabalhar na indústria e serviços nas cidades. Como o trabalho no campo é muito pouco produtivo, há um grande aumento de produtividade agregada quando isso ocorre.

E a estagnação a partir dos anos 1980? Uma explicação para a semelhança entre os dois países poderia ser o tamanho do Estado. Sabemos que no Brasil o Estado cresceu muito, a carga tributária é muito elevada e que as firmas estatais tendem a ser bem menos produtivas do que as privadas. Além disso, quando os gastos sociais crescem muito pode ser que as pessoas se sintam desestimuladas a produzir, acomodando-se.

Mas não é isso. O Estado mexicano é, na realidade, bem pequeno. Enquanto a carga tributária no Brasil é de 32% do PIB, no México ela é de apenas 17%. Enquanto os gastos sociais no Brasil são de 25% do PIB, no México eles estão em torno de 12%. Assim, não é o tamanho do Estado que explica a trajetória parecida do Brasil e do México. O que será então?

Tanto o Brasil como o México possuem, segundo Acemoglu e Robinson, instituições políticas extrativas, ao invés das inclusivas, que, segundo os autores, “permitem e encorajam a participação da grande massa de pessoas nas atividades econômicas para que façam o melhor uso dos seus talentos e habilidades (…) e um sistema judiciário que seja igual para todos…”.

Para sair da armadilha da renda média, seria necessário criar nesses países instituições políticas inclusivas, em que haveria incentivos para as pessoas investirem em educação e para as pequenas firmas investirem em produtividade. Atualmente, as pessoas mais pobres sabem que, por mais que se esforcem na escola, dificilmente terão condições de competir com as que nasceram nas famílias mais ricas. Da mesma forma, as pequenas empresas não têm incentivos para crescer porque irão cair na armadilha tributária, sem os privilégios que as grandes empresas conseguem obter do governo, através do BNDES por exemplo.

No Brasil as delações premiadas vão aos poucos revelando uma imensa teia de ligações entre governo e parcela significativa do empresariado. Novas leis são criadas apenas para beneficiar quem tem dinheiro e uma parcela enorme de recursos circula livremente entre as esferas pública e privada, à margem de lei.

A soma dos valores envolvidos nos escândalos de corrupção pode parecer pequena. No entanto, a conta correta do custo do patrimonialismo deveria levar em conta todas as distorções no uso dos recursos públicos e nas decisões da Justiça para beneficiar os mais poderosos, no governo federal, Estados e municípios. Além disso, deveríamos levar em conta também o desestímulo ao investimento privado por conta da desigualdade de oportunidades. O efeito disso sobre a produtividade é brutal.

Em suma, o crescimento econômico no Brasil só ocorrerá quando acabarmos de vez com a corrupção e criarmos instituições econômicas inclusivas. O primeiro passo nessa direção é levar a Operação Lava-Jato até o fim e punir todos os empresários e políticos corruptos, tanto no governo atual como nos anteriores. A aprovação das reformas não é prioridade agora. A prioridade é mudar o país.

As opiniões aqui expressas são as do autor e não refletem necessariamente as do CDPP, tampouco as dos demais associados.

Sobre o autor

Naercio Menezes Filho