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Não há liberdade nem democracia sem a firme atuação da sociedade civil

Não há liberdade nem democracia sem a firme atuação da sociedade civil

Virtú News (publicado em 12/08/2021)

Provocou surpresa e alívio a recente manifestação de mais de duas centenas de empresários, intelectuais e líderes de diversas áreas da sociedade brasileira em vigorosa defesa da democracia. Em poucas horas, a ideia de um manifesto discutida entre associados do Centro de Debate de Políticas Públicas – CDPP ganhou forma e adesões, e chegava aos jornais, para publicação. A rapidez na aglutinação de pessoas de relevo no cenário nacional, a contundência do recado e as declarações públicas subsequentes de signatários revelam elevado grau de amadurecimento de parcela significativa das lideranças do País diante das crises simultâneas que vivemos. Um alento mais do que bem-vindo. A história mostra que a participação ativa dos cidadãos na vida pública é o melhor, senão o único remédio contra o populismo e as investidas autoritárias que assolam vários países, e que no Brasil se manifestam de maneira grotesca, grosseira e cruel.

Coerente com a sua histórica repulsa à democracia, Jair Bolsonaro vem seguindo à risca a cartilha de candidato a ditador, cujo princípio básico é destruir, por dentro, as instituições democráticas. Órgãos do Poder Executivo passam a fazer o oposto do que deles se espera. Em meio a uma pandemia, a saúde é entregue a curandeiros e à sanha de corruptos de plantão, custando 565 mil vidas até agora. O meio ambiente vem sendo destruído com a ajuda de quem deveria defendê-lo; a educação desapareceu; o Brasil se isolou, virou um pária no mundo.

Nada disso é fruto do acaso, é intencional. Sob o pretexto de garantir “apoio no Congresso”, bilhões são gastos de maneira duvidosa para consolidar alianças com quem mais distante da defesa do bem comum estiver. Com isso consegue blindagem contra “remédios amargos” — o impeachment — e deslegitima outro pilar fundamental da democracia, o Poder Legislativo. Não contente em enganar eleitores que nele votaram acreditando na sua “conversão” à civilização, e em mostrar a céu aberto quão venais podem ser alguns dos representantes eleitos pelo povo, tudo faz para provar que o processo eleitoral não é confiável. Seus tentáculos alcançam os órgãos de controle, desenhados para servir de freios e contrapesos entre os poderes, tornando-os inoperantes.

Mas, felizmente, entre nós um candidato a ditador enfrenta alguns adversários mais resistentes e difíceis de serem derrotados: o Poder Judiciário, a imprensa livre e a sociedade civil. O Supremo Tribunal Federal (STF), encarregado de interpretar e aplicar a Constituição, e o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a quem cabe a organização do processo eleitoral, são alvos prioritários óbvios a quem quer subverter as regras democráticas. Normas claras de acesso e funcionamento tornam o processo de aparelhamento e controle desses órgãos difícil e demorado. Com a experiência acumulada durante os anos de chumbo da ditadura militar ainda fresca na memória de muitos, a imprensa vem resistindo bravamente aos ataques diários e à profusão de fake news plantadas nas mídias sociais. Já a sociedade civil, que há anos vem oferecendo propostas para problemas na economia, educação, saúde, segurança, desigualdade, entre tantos, mostra vigor e coragem à altura dos desafios propostos pelo momento. Há esperança quando a defesa da democracia mobiliza e une o país.

Além da fragilização institucional em andamento, os efeitos colaterais do não-governo refletidos no número de vítimas da pandemia; no ressurgimento da inflação; no desemprego, desigualdade e insegurança crescentes atestam o rápido agravamento dos problemas sociais e econômicos. Não é possível ignorar os riscos que nos espreitam até a próxima eleição. Em que estado chegaremos lá? Vale a pena esperar para ver? Precisamos unir esforços para defender a democracia, recuperar a disciplina fiscal, retomar as reformas imprescindíveis ao desenvolvimento econômico e social do país. Não há nem liberdade e nem democracia sem a firme atuação e participação da sociedade civil.

Link da publicação: https://virtunews.com.br/nao-ha-liberdade-nem-democracia-sem-a-firme-atuacao-da-sociedade-civil/

As opiniões aqui expressas são do autor e não refletem necessariamente as do CDPP, tampouco as dos demais associados.

Sobre o autor

Cristina Pinotti