Folha (publicado em 13/02/2022)
Faz mês e meio que o ano iniciou, mas vale compartilhar com os leitores qual é, para mim, a agenda de temas para olharmos e investigarmos ao longo de 2022.
No cenário internacional, o tema mais relevante, e a maior fonte de risco para as economias emergentes hoje, é a natureza do processo inflacionário americano. Há duas possibilidades. Primeiro, com a reversão dos choques, a inflação ceder. Nesse caso, dado que em mais dez meses o mercado de trabalho estará a pleno emprego (isto é, na mesma posição que estava em fevereiro de 2020), o banco central dos EUA, conhecido por Fed, terá que suavemente subir a taxa nominal para a neutra, hoje calculada em 2,5% ao ano.
A segunda possibilidade é que a inflação ganhe inércia e sua alta atual não seja totalmente revertida com a reversão dos choques. Nesse caso, o Fed terá que subir bem mais os juros para a inflação voltar para a meta.
Juros altos por lá sempre machucam os países emergentes. O segundo tema na economia internacional a ser acompanhado é a reversão dos diversos choques. Tudo sugere que portos, fretes e movimentos de contêineres melhorem bem ao longo do primeiro semestre.
Carvão termal e gás, principalmente na Eurásia, devem se normalizar ao longo do ano, se nada de muito grave ocorrer na Ucrânia. O suprimento de chips não automotivos deve se normalizar ao longo do ano, e o dos automotivos, em 2023. A normalização do petróleo deve ocorrer mais à frente, 2023 ou 2024.
O terceiro tema na agenda internacional é a safra mundial de grãos. Desde que chineses abateram 40% do rebanho suíno por causa da gripe suína africana em 2019 e o reconstituíram com modernas granjas, a demanda global por soja e milho subiu aproximadamente 5%. Estoques em baixa bateram nos preços. No ano passado, a safra não foi boa. Preços ainda elevados. Será que haverá normalização mais intensa do preço da ração animal?
Importante para definir como andará a inflação para toda a cadeia de proteína animal: carnes, laticínios e ovos.
Na agenda doméstica, o item mais importante é sabermos com qual roupa Lula governará a partir de 2023 se ganhar as eleições de outubro, como sugerido pelas pesquisas.
Em segundo lugar, há muita dúvida relativa ao cenário de atividade. O mercado enxerga a economia andando de lado ou recuando. A mediana das expectativas da pesquisa Focus, conduzida semanalmente pelo BC, indica crescimento de 0,3% em 2022. No entanto, me parece que haverá crescimento na casa de 1% a 1,5%.
Difícil imaginar economia parada ou recuando em ano eleitoral com estados com finanças confortáveis —em 2021, o crescimento da receita real de ICMS foi de 16% ante 2019.
O terceiro tema na agenda doméstica é observar a deterioração fiscal na União em consequência de medidas populistas de Bolsonaro para tentar se reeleger. Estamos em uma situação que guarda semelhança com 2014, quando a presidente Dilma Rousseff promoveu forte deterioração das contas públicas para garantir a reeleição.
Ganhou mas “não levou”. Perdeu a governabilidade foi impedida. Como escrevi neste espaço recentemente, estelionato eleitoral não é questão moral. É da natureza da democracia ciclo político na despesa pública.
Se errar na dose, ganha perdendo, como avisou a Dilma, em 2014, Marina Silva. Ganha e não governa. Esses são os temas para acompanharmos em 2022.
Link da publicação: https://www1.folha.uol.com.br/colunas/samuelpessoa/2022/02/agenda-para-2022-inclui-inflacao-nos-eua-e-eleicoes-no-brasil.shtml
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