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A hora é de respeitar o teto de gastos

Modificar essa política fiscal significa mexer num pilar da política econômica num momento delicado

Estadão

A equipe da Secretaria do Tesouro Nacional disse numa entrevista recente que pretende discutir uma versão mais flexível do teto de gastos, baseada numa meta de dívida pública. Se tal ideia evoluir, será levada ao Congresso após a eleição.

Qualquer mudança no teto de gastos neste momento é extremamente negativa, abrindo a porta para a disputa de diversos setores e regiões por dinheiro, sem limitação e sem fonte adicional de recursos. Uma mudança do teto de despesas para uma meta da dívida pública é uma péssima ideia: abre a porta para a pressão sobre o Banco Central para baixar os juros e facilitar o cumprimento da meta. A lei diz que em 2026 o teto pode ser revisto; até lá, tem de ser cumprido. Ponto final.

Modificar o teto significa mexer num pilar da política econômica num momento delicado. Tudo indica que 2023 será um ano desafiador, de baixíssimo crescimento do PIB (projeção de 0,37% no Relatório Focus da semana passada), com inflação e juros altos no Brasil e no mundo e uma quase certa recessão nas maiores economias. Será neste contexto que o Brasil terá de restaurar a confiança perdida. Para isso, será essencial retomar a disciplina fiscal – um trabalho difícil, que o teto facilitaria.

O teto de gastos está pronto, em vigor e já mostrou que funciona; é preciso respeitá-lo

Por dois anos consecutivos o Brasil driblou o teto de gastos para turbinar o crescimento deste ano, como estamos presenciando. No ano passado, uma jornalista me perguntou se o teto não estava desmoralizado. Respondi: é a política fiscal que está desmoralizada, não o teto. O teto de gastos torna explícito o descontrole da política fiscal. O Estadão mostrou que devem faltar R$ 306 bilhões no caixa em 2023.

Tanto o ex-presidente Lula quanto o presidente Jair Bolsonaro garantem que o Auxílio Brasil de R$ 600 será prorrogado, apesar de a Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2023 projetar R$ 400 e não haver dinheiro para o excedente. O problema não é o teto, é a incapacidade do governo de escolher prioridades – no caso, uma despesa social importante – e fazer a reforma administrativa para gerar espaço no orçamento.

O teto de gastos foi estabelecido em 2016, quando assumi o Ministério da Fazenda numa situação parecida. Devido ao descontrole fiscal do governo anterior, entre junho de 2015 e maio de 2016, a retração do PIB foi de 5,2%, uma das maiores da história do País. Após a implantação do teto, os investimentos voltaram e a economia cresceu 2,2 % de janeiro a dezembro de 2017.

O teto de gastos está pronto, em vigor e já mostrou que funciona. Respeitá-lo é o caminho mais curto e eficiente para o Brasil enfrentar o que vem pela frente e se recuperar.

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As opiniões aqui expressas são do autor e não refletem necessariamente as do CDPP, tampouco as dos demais associados.

Sobre o autor

Henrique Meirelles