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Completou-se a recuperação pós-pandemia

PIB e PO já estão acima do nível pré-pandemia, com reabertura econômica e expansão fiscal eleitoral. Em 2023, com pleno emprego e inflação bem acima da meta, será preciso contração fiscal para que em 2024 inflação vá para meta.

FGV IBRE

No início de setembro, o IBGE divulgou o desempenho da economia brasileira no segundo trimestre de 2022. A equipe de economia aplicada do FGV Ibre esperava crescimento de 1% ante o primeiro trimestre de 2022 e de 2,9% ante o segundo trimestre de 2021. Os resultados divulgados foram um pouco melhores, respectivamente 1,2% e 3,2%.

Há sinais de que praticamente se completou o processo de recuperação da economia em seguida ao tombo do segundo trimestre de 2020, de 9%. No segundo trimestre de 2022, a economia rodou 3% acima do nível anterior à epidemia, isto é, do quarto trimestre de 2019. Mas o sinal mais claro de que se completou a recuperação é o dado dos ‘outros serviços’, o segmento mais afetado pela crise e de recuperação mais lenta. Outros serviços respondem por aproximadamente 15% da economia, mas por 34% do emprego. No segundo trimestre deste ano, o segmento apresentou forte recuperação, rodando 4,4% acima do quarto trimestre de 2019, 3,3% acima do primeiro trimestre de 2022 e 13,6% acima do segundo trimestre de 2021.

A figura apresenta a trajetória da economia brasileira em bases trimestrais, com ajuste sazonal, desde 2007. A base 100 está no quarto trimestre de 2022. A tendência para o período posterior à grande crise brasileira de 2014 a 2017 foi calculada considerando como base o período do primeiro trimestre de 2017 até o quarto trimestre de 2019. A tendência de crescimento nesse triênio foi de 1,3% ao ano. Com a última divulgação do IBGE, a economia situou-se, no segundo trimestre de 2022, 0,29% abaixo da tendência prévia.

Além de boas notícias na atividade econômica, temos tido ótimas notícias no desempenho do mercado de trabalho. A tabela abaixo apresenta uma fotografia do mercado de trabalho no segundo trimestre de 2022. Cada linha da tabela representa a taxa de variação em relação a três bases diferentes de comparação. Na primeira coluna da tabela estão as taxas de crescimento para a população ocupada (PO) e, na segunda coluna, para a massa salarial, o resultado da multiplicação da PO pelo rendimento médio.

BASEPOPULAÇÃO OCUPADAMASSA SALARIAL
1º TRI 20222,04,1
2º TRI 202111,14,8
4º TRI 20196,2-2,2

A PO cresceu 2% ante o primeiro trimestre de 2022, 11,1% ante o segundo trimestre de 2021 e rodou, no segundo trimestre de 2022, 6,2% acima do nível anterior à pandemia. Como comparação, na economia americana, que tem se recuperado muito rapidamente, a PO encontra-se somente 1% acima do nível pré-crise.

 PIBConsumo das FamíliasConsumo do GovernoFormação Bruta de Capital FixoExportaçãoImportação
 BrasilEUABrasilEUABrasilEUABrasilEUABrasilEUABrasilEUA
2019.IV100100100100100100100100100100100100
2020.I989999981001011049996969997
2020.II8990888992102889196768880
2020.III9697949795101989697858294
2020.IV9998979897101113100968997100
2021.I1009997100961021221049989108103
2021.II100101971039810211710410990105104
2021.III10010198104981021171041018999106
2021.IV101103991049910111710510194100110
2022.I10210399105991011131071069296115
2022.II1031031021059810011910610496103116

A tabela acima apresenta a comparação da trajetória de recuperação da economia brasileira e da americana em seguida à crise causada pela epidemia, para o produto interno bruto (PIB) e para os principais componentes da demanda agregada. Em todas as séries considerei nível 100 para o quarto trimestre de 2019. Tanto a economia brasileira quanto a americana encontram-se 3% acima do nível anterior à pandemia. Há diferenças de composição na recuperação. No Brasil, o investimento voltou muito mais forte, fruto também do nível muito deprimido que vigorava antes da crise. E a retomada do consumo foi mais intensa para a economia americana. De qualquer forma, há grande paralelismo entre as trajetórias de recuperação das duas economias.

O que esperar para o segundo semestre de 2022? A surpresa positiva no primeiro semestre deste ano teve dois motores. Primeiro, as forças da reabertura da economia. Como vimos, o principal motor dessa recuperação, o segmento de outros serviços, já se normalizou. O segundo motor do desempenho melhor foi a expansão fiscal em ano eleitoral, em função do ciclo político da despesa pública. Este motor ainda estará conosco no segundo trimestre. Finalmente, há um terceiro motor que deve manter desempenho ligeiramente positivo neste segundo semestre. No segundo trimestre de 2022, a massa salarial real, como ilustrado pela tabela, cresceu 4,1% em relação ao primeiro trimestre e 4,8% em bases interanuais.

Assim, é possível que os fatores listados no parágrafo anterior continuem compensando a contração monetária e o ano termine com crescimento entre 2,5% e 3% e com a taxa de desemprego na casa de 8,5%. O(a) novo(a) presidente, ou o atual, se reeleito, ao se sentar na cadeira no Palácio do Planalto, olhará 2023 e verá uma economia a pleno emprego com inflação bem acima da meta. O ciclo político na despesa falará mais alto. Em 2023 teremos contração fiscal. Caso contrário, será muito difícil para o Banco Central entregar inflação na meta em 2024.

Link da publicação: https://blogdoibre.fgv.br/posts/completou-se-recuperacao-pos-pandemia

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Sobre o autor

Samuel Pessôa