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Após mais de 365 dias de governo, testemunhamos várias contradições importantes. O ambiente macro relativamente melhor. O ambiente micro com várias tentativas de “desreformar”, que só não vingaram porque o Congresso não deixou. O que não dependeu do Congresso realmente involuiu. No lado institucional, cansamos de ver que a impunidade amplia sem parar seu alcance, desde o “Supremo dos amigos” ao cancelamento de multas que foram consequência de delações firmadas e acabadas.
O que tudo isso pode nos dizer? Um país consegue se desenvolver de verdade se enfraquece suas instituições, mesmo num ambiente macroeconômico favorável?
Quando olhamos a conjuntura, vemos um 2023 com maior crescimento que o esperado. No início do ano a expectativa era de um crescimento inferior a 1%, e agora deve ser ao redor de 3%. A inflação finalmente voltou à meta do BC e ele pode entrar num processo sustentável de redução da taxa de juros, provavelmente encerrando com um juro ao redor de 9%. A balança comercial surpreende muito positivamente, com um superávit chegando ao redor de US$ 90 bilhões, deixando nosso balanço de pagamentos bem robusto e sustentável.
Além disso, na conjuntura, um grande destaque foi a aprovação da reforma tributária. Embora seja necessário definir pontos em aberto envolvendo alíquotas e setores envolvidos na discussão de tratamento especial, a medida está finalmente caminhando gradualmente após anos engavetada no Congresso. Nos lembremos que a nossa recente revisão positiva de rating teve como elemento essencial a aprovação da reforma. Temos um cenário fiscal que está longe de ser o ideal e recheado de desafios daqui para frente, como sempre foi. De fato, o ponto de interrogação mais relevante será a alteração, ou não, da meta fiscal a partir do mês de março. Mas devemos reconhecer que a Fazenda tem perseverado na busca por receitas extras para chegar mais próximo da meta. No entanto, o desafio com o horizonte fiscal além de 2024 parece cada vez mais evidente. A questão é que o ano corrente contará com o apelo de medidas que não serão recorrentes nos anos seguintes. Acabamos de ver a notícia que o governo calcula que o estouro da meta fiscal neste ano implica em um corte de R$ 16 bilhões no orçamento de 2026, justamente em ano de eleição presidencial. No lado do enfraquecimento institucional, 2023 foi iniciado a todo vapor com as tentativas antirreformas do governo.
A largada se deu com o questionamento da independência do Banco Central – sem ganhar tração – e os ataques diretos a figura do presidente do BC, Roberto Campos Neto, que passou por várias sessões no Senado prestando esclarecimentos públicos. Vimos a falha tentativa do governo de retroagir com o já aprovado marco legal de saneamento, sob o argumento de que empresas privadas não deveriam se envolver com um serviço ofertado pelo Estado. Ademais, mudanças na Lei das Estatais foram aprovadas para acomodar figuras políticas em cargos de diretoria de estatais. Houve um movimento que podemos definir como “Supremo Tribunal Federal (STF) dos amigos”. Reparemos no que aconteceu no processo de indicação de novos ministros do STF: um deles foi fiel escudeiro de Lula, atuando na defesa e consequente inocência do presidente contra os processos e julgamentos envolvendo a operação Lava Jato desde 2013. O outro é um amigo de longa data, simpatizante do comunismo, publicamente declarado, que chegou a fazer campanha quando o atual presidente disputava sua primeira eleição em 1989, mas antes do STF, já havia sido colocado no cargo de ministro da Justiça. Não à toa o Brasil caiu de novo no ranking global que mede percepção da corrupção, divulgado desde 1995 pela ONG Transparência Internacional. Numa pesquisa publicada dias atrás ficamos na 104ª posição entre 180 países. Realmente de se lamentar. Do lado micro, estamos voltando a políticas antigas e comprovadamente equivocadas, que reduzem a produtividade, competitividade e a nossa capacidade de crescimento. É o caso do aumento de impostos de importação para uma série de importantes itens; BNDES buscando políticas que deram muito errado no passado; e Petrobras com sua nova política de preços, no mínimo, pouco transparente e um plano de negócios com muita cara de intervencionismo. Muitas vezes os mercados, os ativos financeiros, reagem mais a conjuntura de curto prazo. Nos dando sinais de que as coisas estão melhorando. Mas não existe um só país que enfraquece suas instituições e consegue promover mais bem-estar de sua população depois disso.
Respondendo a indagação “que país é esse?” do Legião Urbana: é o país das contradições.
*Este artigo teve a co-autoria do economista da Jive Investments Luan Takada.
Link da publicação: https://www.linkedin.com/pulse/nossa-pa%C3%ADs-n%C3%A3o-%C3%A9-para-principiantes-luiz-fernando-figueiredo-hkrsf/
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