Limites temporais vêm sendo impostos, só que é preciso mais
JOTA
Quanto a prazos máximos para intervenções de autoridades, o direito administrativo vem melhorando. Nem sempre por força de lei e frequentemente com incoerências dos tribunais ou sabotagens. Mas ele avança e é preciso ir além.
Um movimento legislativo começou nos anos 1990. Leis de processo administrativo limitaram a 10 anos (lei paulista de 1998) ou 5 anos (lei federal de 1999) o prazo para invalidação de atos. Outra lei federal de 1999 deu 5 anos para as sanções de poder de polícia da administração federal (com prescrição intercorrente em 3 anos). Em 2021, a nova Lei de Licitações estendeu essa solução para sanções em licitações e contratos.
O Supremo Tribunal Federal (STF) alargou a tendência, invocando a segurança jurídica. Em 2017, impôs os limites de 5 e 3 anos também para a ação punitiva do controle de contas federal (MS 32.201/DF). Em 2022, reconheceu sua validade no controle de contas subnacional (ADI 5.384/MG). Em 2020, afirmara ser “prescritível a pretensão de ressarcimento ao erário fundada em decisão de Tribunal de Contas” (Tema 899) e que o controle de contas tem 5 anos para a atuação revisional de atos previdenciário-funcionais, após o que estarão registrados de modo tácito e definitivo (Tema 445). Em 2021, estendeu o prazo federal de 5 anos também para a invalidação de atos pela administração subnacional, afastando prazo maior da lei paulista (ADI 6.019/SP).
A jurisprudência constitucional vem, assim, construindo um regime multisetorial (aplicável a invalidações, controles administrativos de ofício, sanções contratuais, disciplinares, regulatórias, ambientais, urbanísticas etc.), interorgânico (aplicável aos diversos órgãos e Poderes de cada ente da Federação) e multinível (federal, estadual, distrital e municipal).
Mas alguns controladores de contas ainda resistem em aceitar a jurisprudência, como notou a equipe do Observatório do TCU do Grupo Público da FGV Direito SP + Sociedade Brasileira de Direito Público (sbdp) neste artigo.
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) também vem sendo pouco coerente. Embora tenha afirmado o caráter geral e nacional do prazo para autotutela de invalidação (Súmula 633), negara-se antes a fazê-lo quanto aos prazos do processo administrativo sancionador (REsp 1.115.078/RS, de 2010) e tem mantido essa posição.
Dois exemplos ruins de incoerência. Jurisprudência constitucional tem de ser respeitada. Os ministérios públicos fariam bem em cuidar disso, em sua missão de “defesa da ordem jurídica” (Constituição, art. 127).
Acabar com a inércia administrativa é missão ainda inconclusa. Repetem-se imposições cautelares de tombamentos provisórios, congelando propriedades, sem que os processos tenham prazo para acabar. Nos licenciamentos, a praxe é o particular esperar sentado (fracassou, nas discussões de uma lei geral de liberdade econômica em 2019, a tentativa de criar prazos legais para isso).
O tempo máximo para a ação administrativa é algo que precisa ser disciplinado, seja por consideração ao Estado de Direito, seja para corrigir inconsistências atuais e seus efeitos negativos.
Link da publicação: https://www.jota.info/opiniao-e-analise/colunas/publicistas/o-direito-administrativo-contra-a-inercia-das-autoridades-20062023
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