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Etelvina

Eu pensava que todo tipo de jogo era ilegal no País até ver cada vez mais comerciais de sites de aposta

Estadão

Eu pensava que todo tipo de jogo era ilegal por aqui. Até que comecei a ver cada vez mais comerciais de sites de apostas. Já são mais de 500 sites disponíveis, que arrecadam acima de R$ 10 bilhões. Não tinha noção do tamanho desta atividade nem sabia que era legal.

Desde 2018 esse tipo de jogo é permitido por lei, desde que não haja casa de apostas em pontos físicos. Empresas e sites devem estar sediadas em outros países, mas brasileiros têm acesso a eles. Saíram da obscuridade para se tornar grandes patrocinadores no futebol e até mesmo em torneios de tênis. Esportistas famosos são seus garotos-propaganda.

Uma denúncia de manipulação de resultado na Série B me chamou atenção para o assunto. Descobri que a CBF está analisando mais de 139 movimentações atípicas nesses sites só em 2022. Só que a lei não foi regulamentada até hoje. Qual a lógica de liberar essas apostas e manter a proibição para jogos de azar? O presidente Dutra fechou os cassinos em 1946. Dizem que por pressão de Dona Santinha, que achava o jogo moralmente degradante para o ser humano.

Mas, com a proibição, o jogo do bicho cresceu na clandestinidade. Sua popularidade foi consagrada na voz de Moreira da Silva: “Etelvina, acertei no milhar”. O que separa o legal do ilegal é a palavra azar. A diferença viria do caráter técnico: as apostas esportivas se baseiam em estatísticas, reduzindo a aleatoriedade. Vale para o futebol, para o turfe, assim como o pôquer online que exigiria mais técnica do que sorte.

Cresci com o pano verde por perto. Toda semana meu avô reunia amigos em torno da mesa com fichas de madrepérola, baralhos novos e uma vareta de bambu com uma borrachinha na ponta para recolher fichas e cartas. Ganhávamos os baralhos descartados, praticamente novos. Ouvia na infância as músicas e as histórias dos shows no Cassino da Urca, do glamour do Copacabana Palace e das férias no Quitandinha.

Argumentos contra legalização vão desde a facilitação de crimes como lavagem de dinheiro, que já aconteceu com os bingos, ao perigo de a atividade ser dominada por criminosos que hoje exploram jogos de azar, como caça-níquel. Manter a clandestinidade não elimina esses problemas. Falta regular seriamente. Haddad promete uma legislação para a taxar os jogos. Ela deveria vir no lugar do péssimo PL 441/91.

Os principais adversários da legalização estão na bancada religiosa do Congresso. O argumento moral não me convence. Conscientização, taxação e punição – quando prejudicam terceiros, seriam suficientes. Estou como Zeca Pagodinho: se quiser jogar, eu jogo.

Link da publicação: https://www.estadao.com.br/economia/elena-landau/separa-jogo-legal-do-ilegal-e-palavra-azar/

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Elena Landau