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O enigma mexicano

Apesar de múltiplos esforços, crescimento médio do México de 2000 a 2019 foi de 1,6% ao ano, bem baixo

Folha

América Latina está há muitas décadas na armadilha da renda média. Uma renda per capita de um sexto a um terço da renda per capita americana, a depender do país, sem conseguir reduzir a diferença com o gigante ao norte.

O Brasil, por exemplo, tinha em 1900 o mesmo um quinto da renda per capita americana que tem hoje.

Após um período com elevada desorganização macroeconômica, do pós-guerra até meados da década de 1990, diversos países, uns antes, outros um pouco depois, encontraram o caminho da estabilidade macroeconômica. Argentina e Venezuela ficaram para trás.

México foi uma das economias da região que mais avançaram na estabilização macroeconômica. A inflação nos últimos dez anos foi de 4,7% ao ano, a poupança doméstica é de 22% do PIB, a carga tributária e a dívida pública bruta são baixas, na ordem de 23% e 52% do PIB, respectivamente.

Os mesmos números para o Brasil são 6%, 14%, 41% e 88%. Os dados são do FMI. Não surpreendentemente, nos últimos dez anos a taxa real básica de juros no México tem rodado a 1% ao ano, contra 4% no Brasil.

Adicionalmente, o México avançou muito na integração de sua economia à internacional, com a construção da zona de livre-comércio da América do Norte, o Nafta.

As exportações cresceram de 25% do PIB em meados da década de 1990 para os atuais 35%. As exportações de manufaturados do México totalizam 27% do PIB do país, o que, em termos absolutos, representa mais do que o resto da América Latina somado.

Houve melhoras persistentes, quantitativas e qualitativas, na educação. Adicionalmente, as taxas de investimento se elevaram de 21,5% do PIB em meados dos anos 1990 para 23,5% do PIB a partir de 2011 até 2019.

Houve esforços de liberalização de inúmeros setores da economia, bem como se avançou bem na agenda da privatização.

Em que pesem todos os esforços, o crescimento médio do México de 2000 até 2019 foi de 1,6% ao ano, menor do que o crescimento brasileiro e chileno, respectivamente de 2,3% e 3,7%, e menor do que os 3,6% do crescimento mexicano da década anterior.

Há um claro problema de baixa produtividade no México. A eficiência pela qual a economia transforma seus fatores de produção, capital, trabalho e escolaridade, em produto —estatística conhecida por produtividade total dos fatores— reduziu-se em 9% de 1995 até 2019. Dados obtidos da Penn World Table.

O economista mexicano Santiago Levy, no livro de 2018 editado pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento, intitulado “Esforços pouco recompensados, a busca fugidia pela prosperidade no México” (tradução minha), desata o enigma do baixo crescimento mexicano.

A partir de um trabalho cuidadoso, com dados desagregados por firma do censo econômico mexicano, Levy documenta que, entre meados da década de 1990 e meados da década de 2010, o capital e o trabalho foram alocados em empresas menos produtivas.

Em que pese toda a agenda de reformas liberalizantes e da conquista da estabilidade macroeconômica, diversos incentivos estimularam o crescimento e o surgimento de empresas pouco eficientes.

Tanto os custos do trabalho quanto a tributação penalizam muito as empresas grandes com contratos de trabalho formal no México.

Essas são as empresas que mais inovam e nas quais o trabalho qualificado mais tem oportunidades de progredir e de elevar a sua produtividade ao longo do ciclo de vida produtiva.

Levy documenta que a regulação do mercado de trabalho e a legislação tributária agravaram a má alocação dos fatores de produção entre meados dos anos 1990 e meados dos anos 2010. O livro pode ser baixado neste link. Há uma excelente palestra recente na Cepal de Santiago Levy que pode ser vista pelo YouTube.

Link da publicação: https://www1.folha.uol.com.br/colunas/samuelpessoa/2024/01/o-enigma-mexicano.shtml

As opiniões aqui expressas são do autor e não refletem necessariamente as do CDPP, tampouco as dos demais associados.

Sobre o autor

Samuel Pessôa